A Peugeot busca uma nova imagem no Brasil. Se antes a marca do leão apoiava suas vendas nos modelos 206 e 207 – que já estavam defasados ante os produtos europeus, mas davam para o gasto num segmento em que preço é fundamental -, hoje a missão é cortejar e conquistar um consumidor mais exigente, com produtos alinhados à gama vendida no Primeiro Mundo.
Dentro dessa nova estratégia, a montadora desidratou o 207 no mercado brasileiro (os derivados sedã, perua e picape saíram de linha, e o hatch sobrevive em uma única versão) e passou a apostar todas as fichas no compacto premium 208 e no novo jipinho 2008. Sem ocupar o segmento de entrada com outros produtos, a francesa investe com convicção em uma gama mais enxuta e focada. É o que explicam o diretor geral da Peugeot no Brasil, Miguel Figari, e o presidente mundial da marca, Maxime Picat, em entrevista exclusiva ao Jornal do Carro.
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JORNAL DO CARRO – A Peugeot tem carros bonitos, bem equipados e com preço competitivo, mas amarga a décima segunda posição em vendas no Brasil, à frente apenas dos fabricantes chineses e das marcas premium. O que falta para a Peugeot vender mais?
Miguel Figari – Nossa marca está em transição de uma fase mais acessível – com a família 207, que competia por preço – para modelos de padrão mais elevado. Queremos conquistar clientes exigentes, que buscam tecnologia, equipamentos e qualidade, e nossa gama está mudando para seguir essa filosofia. Isso implica abrir mão de uma parte que vem a ser a maior fatia do mercado brasileiro. Aqui, 55% dos carros vendidos têm motor 1.0, e não temos essa opção de motor; 53% dos carros vendidos custam menos de R$ 40 mil, e hoje nossa marca parte de R$ 42 mil. Você faz uma renúncia e entra em outro segmento, para ganhar em rentabilidade.
JC – Com a morte do 207 Passion, a Peugeot ficou desfalcada de um sedã de entrada. Esperávamos que a Peugeot fosse lançar aqui o 301, que usa a mesma plataforma do 208 e poderia ser feito em Porto Real (RJ), mas isso não ocorreu. O 301 não seria um sucessor natural?
Maxime Picat – O 301 foi concebido para alguns mercados específicos, mas não para todos; na Europa Ocidental, por exemplo, ele não é vendido. E a estratégia de posicionamento que temos hoje para o Brasil não é compatível com um modelo como o 301. Optamos por oferecer aqui o 208, que está alinhado ao que temos de melhor na Europa.
MF – O 301 não tem todos os conteúdos que queremos oferecer ao cliente, como uma central multimídia com tela sensível ao toque, por exemplo. O mercado brasileiro tem evoluído muito, e só os segmentos com modelos mais equipados estão crescendo. É por isso que preferimos fabricar em Porto Real o 208 e não o 301. O 208 é mais coerente com a nossa estratégia.
JC – Nesse contexto de reposicionamento da marca, já que foi feita a opção pelo 208, há espaço para uma versão “depenada” do 208, para não deixar o segmento de entrada abandonado?
MF – Não. Temos que ser coerentes com o posicionamento que buscamos. Se isso significa abandonar alguns segmentos do mercado, vamos fazer isso e concentrar nossos esforços onde podemos ser mais competitivos.
JC – Nós flagramos uma unidade camuflada, em testes, do que parecia ser uma versão esportiva do 208. O 208 GT vem para o Brasil? Terá duas portas, como o francês, ou quatro, como o brasileiro gosta?
MF – (pausa) Para oferecer um modelo que rode com etanol, como exige o mercado brasileiro, é preciso um desenvolvimento especial. Ainda não terminamos esses estudos e não temos definição de quando lançaremos uma versão esportiva, seja GT ou GTi.
JC – O 208 foi lançado com uma caixa automática de quatro velocidades, que o colocou em desvantagem diante de outros compactos premium com transmissões mais modernas. É viável fazer um upgrade no 208 e dar a ele um câmbio melhor, de outros modelos da marca?
MF – É possível. Mas esse câmbio automático de quatro marchas responde pela maior parte das vendas do 208 hoje. Nosso cliente não é um jornalista apaixonado por automóveis, e sim alguém que usa o carro para trabalhar. Ele veio de modelos com câmbio manual, e o 208 atende totalmente às expectativas, com um consumo razoável. Podemos estudar uma evolução dessa caixa no futuro, mas agora o mercado não precisa dela. O 208 atual é bem aceito.
JC – Existe alguma possibilidade de trazerem o 308 GT de nova geração, como complemento da gama do 308 no Brasil, como uma opção de topo?
MP – É algo que a gente avalia, pois o novo 308 é um carro muito bom. Não seria uma substituição do 308 atual, e sim um complemento, para ampliar nossa gama de produtos. Estamos estudando isso.
MF – Nossa ideia é dar ao nosso cliente uma “linha Mercosul” competitiva, equipada, com bons conteúdos de tecnologia e segurança, e complementá-la com as novidades da Europa.
JC – O 408 e o 508 foram atualizados lá fora. Essas novidades chegam ao Brasil?
MP – A nova geração do 408 foi desenvolvida especificamente para o mercado chinês. O 508 faz parte de um segmento que no Brasil está em baixa, e preferimos não ter aqui uma linha tão grande. Por isso, ainda não decidimos atualizar o 508, embora exista essa possibilidade.
JC – O RCZ e o 308 CC continuam à venda na França, mas não receberam o novo visual do restante da família 308. A Peugeot perdeu o interesse neles?
MP – Esses modelos continuam na linha mundial da Peugeot, mas são parte de um segmento essencialmente europeu. O consumidor desses carros busca se diferenciar, e hoje quem deseja um carro diferenciado compra um utilitário esportivo. Por isso, esses modelos estão em baixa. Quando desenvolvemos o projeto do 208, até chegamos a desenhar a silhueta de um 208CC, mas preferimos dar andamento ao 2008, e foi a melhor coisa que fizemos. Já vendemos mais de 200 mil unidades do utilitário, e não teríamos passado de alguns poucos milhares com o conversível. É preciso reconhecer que o mercado está pendendo mais para o lado dos jipinhos.
JC – Mas então por que vender o 308 CC e o RCZ no Brasil, se são carros tão europeus?
MF – Não há volume, assim como em outros mercados não há, mas é uma questão de imagem. Eles respondem ao que um certo tipo de cliente espera da Peugeot.
JC – Falando sobre o 2008, o Salão de São Paulo exibiu a versão Hybrid Air do modelo. Quais serão as motorizações do 2008 no Brasil? A híbrida é uma possibilidade para o Brasil?
MP – Por enquanto, não decidimos ir adiante com a produção de série do Hybrid Air. Mas é uma tecnologia mundial, que amanhã podemos adaptar a qualquer mercado.
MF – O 2008 brasileiro será um produto muito competitivo, adequado ao mercado brasileiro. Não será exatamente o mesmo 2008 que se vende na Europa. O desenho e o conteúdo são os mesmos, mas a mecânica será adaptada para permitir o uso intenso nas estradas brasileiras. Estamos certos de que será um produto de sucesso dentro do segmento.