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Mercedes: a menina que virou carro
História

Mercedes: a menina que virou carro

Há 120 anos, modelos da Daimler foram rebatizados de Mercédès em homenagem a filha de um cônsul austríaco

Tião Oliveira

07 de abr, 2020 · 11 minutos de leitura.

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mercedes
Mercedes Jallinek
Crédito:DAIMLER/DIVULGAÇÃO

Há 120 anos, em abril de 1900, o austríaco Emil Jellinek batizou de Mercédès os carros que comprara da alemã Daimler-Motoren-Gesellschaft (DMG). Em tradução livre: Empresa de Motores Daimler. A nova marca, nome de sua primeira filha, foi registrada em 1902. Com a fusão da Daimler com a Benz, em 1926, surgiu uma das mais prestigiadas fabricantes de veículos do mundo; a única com nome de mulher.

Embora a história mais aceita é a de que Jellinek quis homenagear a garota, há controvérsias. Há quem diga que o então cônsul geral do Império Austro-Húngaro na França quis evitar problemas judiciais. Jellinek morava com a família em Nice, na Riviera Francesa, quando encomendou carros da fabricante alemã para participar de corridas. O problema é que, com a morte de Gottlieb Daimler, sócio de Wilhelm Maybach na DMG, em março de 1900, a companhia pôs à venda o nome comercial “Daimler”.

Para evitar dores de cabeça, Jellinek mudou os nomes dos carros da Daimler para Mercedes. O primeiro veículo a ostentar a nova marca foi o Mercedes 35 PS, que participou da Semana de Corrida de Nice, em 1901. Por outro lado, é notório que Jellinek batizou várias propriedades, inclusive mansões, com o nome da filha e ficou conhecido como “Senhor Mercedes”. Em julho de 1903, ele recebeu autorização para mudar seu nome para Emil Jellinek-Mercédès. “Provavelmente é a primeira vez que um pai adota o nome de sua filha”, disse o empresário ao celebrar a decisão.

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Uma das cláusulas do contrato entre o cônsul e a DMG previa que os motores dos carros fossem chamados de Daimler-Mercedes. Essa foi a primeira vez que a empresa utilizou formalmente o nome Mercedes.

Sucesso

O fato é que o Mercedes 35 PS fez um grande sucesso – não necessariamente por causa do nome. O modelo é considerado o protótipo do automóvel moderno. Segundo informações da Mercedes-Benz, o carro tinha “arquitetura progressiva e se tornou um modelo para toda a indústria automobilística.”

“Entramos na era da Mercedes”, disse Paul Meyan, então secretário-geral do Automobile Club of France, que organizou a a Semana de Corrida de Nice, logo após a estreia do modelo. De olho nos bons resultados na França, a DMG transformou o Mercedes 35 PS em um carro familiar ao instalar dois bancos na parte traseira. O sucesso foi tão grande que as linhas de produção da DMG tinham de funcionar com capacidade total para atender à demanda.


DAIMLER

A sigla PS é a abreviatura da palavra alemã “pferdestärke” (cavalo-força) e refere-se à potência gerada pelo motor, no caso de 35 cv (de cavalo-vapor, termo utilizado no Brasil). O quatro-cilindros de 2,1 litros era derivado do utilizado no Daimler Phönix, de 1898 – primeiro veículo dotado desse tipo de propulsor no mundo e que também foi encomendado por Jellinek.

O Mercedes 35 PS tinha ótimos 2,35 metros de distância entre os eixos. Para comparação, são apenas 12 cm a menos que o de um Volkswagen Gol. O motor era montado sobre o eixo dianteiro e ficava muito próximo ao chão. As rodas, feitas de madeira e calçadas com pneus de borracha maciça, eram fixas.


Havia dois sistemas de freio. O principal era acionado manualmente e atuava nas rodas de trás – o outro era pelo pé. O sistema secundário tinha corrente e era arrefecido a água. Embora o quatro-cilindros ficasse na frente, o torque (força) era enviado às rodas traseiras por meio de corrente. A alavanca do câmbio de quatro marchas à frente e uma para trás ficava à direita do motorista.



‘Mãe do automóvel’

Se não fosse pelo espírito aventureiro da alemã Bertha Benz, o mundo do automóvel (e talvez a civilização tal qual conhecemos) poderia ter seguido uma direção bem diferente. Ela foi a primeira piloto de testes do mundo. Bertha era casada com o criador do primeiro automóvel do mundo, Carl Benz. Ele não estava seguro sobre sua criação. Mas sua mulher estava.

Mesmo antes de se tornar piloto, Bertha havia ajudado Carl no desenvolvimento do primeiro automóvel patenteado da história, o Patent-Motorwagen. O modelo foi patenteado no início de 1886, e lançado em meados do mesmo ano. Porém, faltavam detalhes importantes para o carro “vingar” do ponto de vista comercial.


MARLOS NEY VIDAL/ESTADÃO

Aventura

Sem Carl saber, Bertha decidiu partir em uma viagem com o Patent-Motorwagen. A jornada começou em 5 de agosto de 1888. Junto com ela, embarcaram na aventura dois de seus filhos, Richard e Eugen, de 14 e 15 anos, respectivamente. Eles saíram de Mannheim, na Alemanha, onde viviam, e viajaram 104 km pela região de Baden-Württenberg, chegando a Pforzheim (cidade natal de Bertha).

Esta foi considerada a primeira viagem longa do mundo feita a bordo de um automóvel. O objetivo de Bertha era mostrar a funcionalidade do veículo, que havia sido lançado dois anos antes, mas não estava despertando interesse do público. A mãe e os filhos tiveram alguns percalços pelo caminho. Não havia postos de abastecimento e a gasolina não era oferecida como um produto comercial, como hoje.


Por isso, o combustível utilizado, um solvente derivado da benzina que Bertha comprou em farmácias pelo caminho, entupiu o tubo de alimentação do motor. A peça foi desobstruída com o uso de um grampo para cabelo. A liga de uma meia foi usada para isolar o curto-circuito em um fio. Com essas soluções, Bertha e os filhos conseguiram concluir a viagem, na qual também foi criado o conceito de lona de freio – a partir de relatos posteriores feitos ao marido.

Na volta de Pforzheim a Mannheim, Bertha escolheu um caminho mais curto, de 90 km, sempre às margens do rio Reno. Com a viagem, Bertha conseguiu atingir o objetivo de mostrar que o Patent-Motorwagen era funcional. A oficina de Carl passou a ser muito procurada por clientes interessados em adquirir o veículo motorizado. Além disso, graças à experiência da mulher e dos filhos na estrada, Carl implementou várias melhorias no carro.

Guerreira

Bertha Ringer nasceu em 1849, em Pforzheim, cidade no sul da Alemanha, no estado de Baden-Württemberg. Em 1872, se tornou Bertha Benz, após casamento com Carl. Juntos, tiveram quatro filhos. Um ano antes, Carl havia criado a Benz.


Em 1926, após fusão com a Daimler, que surgiu como uma fabricante de motores e foi fundada por Gottlieb Daimler e Wilheim Maybach, foi formada a Daimler-Benz. A companhia, que virou global, é conhecida como Daimler AG. O grupo é dono de várias marcas de veículos, entre as quais a Mercedes-Benz.

MARLOS NEY VIDAL/ESTADÃO

Carruagens motorizadas

Os primeiros carros conhecidos eram uma espécie de adaptação de carruagens, que tiveram a tração animal substituída por motor. O primeiro do tipo é o alemão Patent Motorwagen, criado por Karl Benz e registrado em 1886. O veículo tem propulsor de um cilindro e 954 cm3, que gerava o equivalente a 0,9 cv, chassi e transmissão feitos para trabalhar de forma integrada. O Mercedes 35 PS, por sua vez, tem um quatro cilindros formado pela união de dois motores de dois cilindros.


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