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A história do conversível de luxo da Cadillac que quase arruinou a GM
História

A história do conversível de luxo da Cadillac que quase arruinou a GM

Cadillac Allanté tinha carroceria produzida na Itália e enviada de avião para montagem nos Estados Unidos

Igor Macário

29 de abr, 2020 · 9 minutos de leitura.

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Allanté foi desenhado pela Pininfarina
Crédito:Cadillac/Divulgação
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Durante os anos 80, a GM vivia um de seus auges econômicos e queria “turbinar” a Cadillac. A divisão de luxo era a arma da fabricante para enfrentar o sucesso que os modelos europeus de Mercedes-Benz e BMW vinham conseguindo. Uma das estrelas eram os roadsters de luxo, como o Mercedes-Benz SL. Para isso, a Cadillac criou o Allanté, que acabou sendo um de seus maiores fracassos.

O modelo foi lançado em 1987 com direito a design e carroceria feitos pela italiana Pininfarina. A carroceria era produzida em Turim, na Itália, e enviada de avião aos Estados Unidos. As partes eram transportadas em lotes de 56 unidades encaixadas em Boeings 747 de carga especialmente adaptados para esta função. O processo tinha o nome de “Ponte aérea Allanté”.

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O Allanté custava na época US$ 54.700, mais de US$ 100 mil corrigidos para 2020 (cerca de R$ 550 mil em conversão direta). Era mais que o dobro de um Cadillac Eldorado Coupe da época. E trazia algumas particularidades. O modelo era equipado com um V8 de 4,1 litros com apenas 170 cv e tração dianteira. O câmbio era um tradicional automático de quatro marchas e o Allanté demorava quase 10 segundos para acelerar de 0 a 100 km/h.

O powertrain era bem inferior ao usado pela Mercedes nos SL da época. No mercado americano, o SL de entrada usava um seis cilindros em linha de 230 cv e podia ser equipado com câmbio manual, conjunto bem mais animador que o do Allanté. O SL trocou de geração em 1990 por lá, passando à clássica R129, muito superior ao Cadillac.

Luxo anos 80

A cabine era luxuosa para os padrões americanos. No painel, chamava atenção um mostrador digital e comandos eletrônicos para o ar-condicionado. Ainda assim, o teto conversível tinha uma complexa operação que misturava comandos elétricos e manuais. O motorista precisava sair do carro, destravar eletricamente o teto do alto do parabrisa e aí puxar manualmente o conjunto para o alojamento atrás dos encostos de cabeça. Nessa faixa de preço, era algo inaceitável.


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A qualidade dos materiais na cabine também era considerada inferior à dos modelos europeus. Isso não ajudou em nada no sucesso do Allanté, mesmo se tratando de um produto de uma das marcas mais amadas pelo público americano. As primeiras unidades ficaram conhecidas pelo teto que apresentava constantes vazamentos. Isso ocorreu porque a Pininfarina chegou a pedir que a Cadillac atrasasse o lançamento do carro, para que a fábrica italiana conseguisse se adaptar ao projeto. O pedido foi negado pela Cadillac.


Já em 1989 o conversível ganhou mais potência, com 200 cv extraídos de um 4.5 V8. O modelo ainda recebeu suspensão controlada eletronicamente. O sistema endurecia os amortecedores a dois níveis, o primeiro a 40 km/h, o segundo a 90 km/h. Ainda assim, o conjunto era tipicamente Cadillac e muito mais macio que o oferecido pelo SL. O dano causado pela baixa qualidade e desempenho pífio das primeiras safras já estava feito.

Apogeu depois de usado

Nos anos seguintes, o modelo foi ganhando atualizações, mas nunca vendeu mais de 3.500 unidades por ano. O número nem chegava a ser tão baixo, mas ainda eram muito distantes do que a Cadillac pretendia na época. O carro era caro e não estava a altura dos concorrentes. Haviam relatos de vazamentos no teto conversível ainda com o carro novo e até de carrocerias que não encaixaram nos conjuntos mecânicos na fábrica da GM.

A marca ainda lançou uma versão mais barata do conversível. Ela basicamente não trazia o teto rígido entregue junto com o carro. O teto isolava a cabine do exterior de forma mais eficiente e também era oferecida pela Mercedes no SL. Era a alternativa da época, já que não existiam tetos rígidos retráteis e os modelos de lona não conseguiam dar a cabine atmosfera luxuosa o suficiente.


Com o passar dos anos, o Allanté foi ficando ainda mais caro, beirando os US$ 60 mil no último ano de produção, 1993. Ao menos, foi quando o Allanté finalmente recebeu um motor a altura. O 4.6 V6 Northstar era novidade da Cadillac na época e elevou a potência do conversível para saudáveis 300 cv. A suspensão também recebeu melhorias para lidar com a maior força do motor.

Mas o Northstar em si não livrava o Allanté de problemas. Posteriormente, foi descoberto que o motor tinha uma falha de projeto relacionado ao encamisamento dos cilindros. Isso demandava abertura do motor e troca de partes internas para evitar quebra. Nos Estados Unidos, esse serviço podia custar mais caro que o próprio carro, dependendo do modelo.


O Allanté não chega a ser um carro raro nos Estados Unidos. Foram 21.430 unidades produzidas entre 1987 e 1993. No mercado de usados, unidades em bom estado podem ser encontradas com preços na casa dos US$ 10 mil. Até é possível encontrar Mercedes SL com preços parecidos, mas unidades melhores ainda são bem mais caras e colecionáveis.

Crise na GM

O Allanté é uma das peças que culminaram na crise que a GM enfrentaria anos depois. Muito grande, a empresa tinha diversas marcas, todas com projetos especiais que demandavam muito investimento e traziam retorno baixíssimo. Marcas com Saturn, Oldsmobile e Cadillac tinham carros com motores exclusivos e situações fora do comum, como as carrocerias que cruzavam o Atlântico de avião.


Tanto que o modelo saiu de linha e não deixou substituto. A marca só foi ter outro conversível de dois lugares com o XLR, em 2003.

Batismo controverso

Embora remeta a algo luxoso e lembre palavras do francês e do espanhol, Allanté não tem qualquer significado. A Cadillac demorou, mas acabou admitindo que o nome foi escolhido por um programa de computador que analisou 1.700 possibilidades na época.

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