Um bom advogado precisa ter paciência e obstinação para defender causas que podem se desenrolar por anos intermináveis nos tribunais. José Orlando Arrochela Lobo exibe nesta página o resultado de um trabalho que consumiu 13 anos e terminou na semana passada. Foi o tempo que ele levou para comprar e restaurar seu exemplar 1972 do Citroën SM.
O modelo francês entrou na lista de desejos do advogado quando um amigo de seus pais comprou um dos dois exemplares que foram importados para Moçambique, país africano onde ele passou a juventude.
Três décadas depois, já vivendo na capital paulista, Lobo encontrou um SM à venda no Rio de Janeiro. Ele teve de negociar com a viúva do proprietário por dois anos até chegar a um consenso sobre o valor final do negócio. Como estava parado havia 15 anos, o cupê de visual arrojado precisou de muitos reparos. A restauração se estendeu por outros onze anos, até o início deste mês.
“Sem a internet, eu teria levado 20 anos”, acredita o advogado. “Garimpei peças na França, Inglaterra, Estados Unidos, Canadá e até Austrália. Tive até de recuperar alguns componentes que não encontrei.”
Inovador. Trata-se de um modelo de mecânica sofisticada. Um dos destaques é o sistema hidropneumático que comanda suspensão, freios, direção e faróis, herdado do Citroën DS.
Um botão no console central permite elevar a suspensão em relação ao solo, adaptando o veículo a diferentes condições de piso e volumes de carga. Dos seis faróis dianteiros, dois giram com o volante, acompanhando a direção das rodas.
“O carro é uma nave espacial. Dificilmente eu conseguiria outro antigo tão moderno”, empolga-se o proprietário. “Ele tem um conforto e um refinamento que não se associa a modelos dos anos 1970. Perto dele, os veículos da mesma época se tornam até rústicos.”
Lobo está se acostumando aos poucos com o carro, que tem um comportamento dinâmico bastante peculiar. “A direção é estupidamente leve em baixas velocidades, você pode contornar curvas com um dedo. Mas o volante volta para o centro muito rápido, portanto não se pode soltá-lo de uma vez”, explica.
“Não há pedal de freio, e sim um botão muito sensível. Se aplicasse nele a força habitual, eu voaria pelo para-brisa se estivesse sem o cinto”, brinca o advogado.
História. O Citroën SM foi revelado no Salão de Genebra (Suíça) de 1970. Produzido pela italiana Maserati, marca da qual a Citroën foi proprietária entre 1968 e 1975, seu motor V6 de 2.670 cm3 tem três carburadores de corpo duplo.
Com ele, o cupê vai de 0 a 100 km/h em 8,5 segundos e atinge os 225 km/h – foi o modelo de tração dianteira mais veloz de seu tempo e recebeu dos fãs o apelido de “Sa Majesté” (Sua Majestade, em francês).A mistura de sofisticação e esportividade colocava o SM no mesmo nível de rivais como Jaguar XJ6 e BMW 3.0 CS.
A crise mundial do petróleo, em 1973, comprometeu a sobrevida de modelos com consumo elevado de combustível, como o SM. Com a aquisição da Citroën pela Peugeot, em 1974, a nova diretoria do grupo PSA decretou o fim do carro, que despediu-se em 1975 com 12.920 unidades fabricadas.