Nos últimos dois anos, dois carros com tabela acima de R$ 65 mil passaram a aparecer com frequência no ranking dos dez mais vendidos do País: Toyota Corolla e Honda HR-V. Mais que a qualidade desses produtos, o que atrai o consumidor é a boa fama construída por suas fabricantes. No quadro de queixas da seção ‘Defenda-se’, há alternância entre diversas montadoras, inclusive de veículos de luxo. Uma marca, porém, nunca apareceu no quadro: a Toyota. Arquirrival e também de origem japonesa, a Honda já esteve lá, embora isso seja muito raro.
A Toyota é a marca que tem o maior nível de satisfação de clientes entre as que atuam no País, de acordo com pesquisa da consultoria automotiva global J. D. Power. Na mais recente edição do estudo anual, divulgada em julho de 2016, a marca apareceu no primeiro lugar.
No Brasil, a Toyota também é considerada a marca que mais fideliza os consumidores. Isso significa que quem compra um carro da empresa está disposto a continuar sendo cliente em sua próxima aquisição. Segundo informações da companhia, seu índice de fidelização, apurado em pesquisas com compradores, é um dado sigiloso.
“O consumidor é fiel ao veículo que o atende bem, gera nenhuma ou poucas visitas à oficina e tem bom valor de revenda”, diz o consultor automotivo André Beer. A Honda também tem fama de atender esses requisitos, embora não esteja tão bem posicionada quanto a rival na pesquisa de satisfação da consultoria internacional J. D. Power, na qual é a quinta colocada.
Com a palavra, o consumidor: “Eu tinha um Fiesta, de que gostava, mas decidi investir em um veículo com bom valor de revenda”, diz o jornalista Alexandre Cossenza. Ele conta que o “prejuízo” que levou na hora de revender seu Ford com câmbio automatizado o fez optar por um Honda City quando decidiu comprar um carro zero-km.
De acordo com Cossenza, o City não era sua primeira opção por causa do preço – pagou cerca de R$ 80 mil. Ele gostou do Peugeot 2008 e do Hyundai Creta, mas escolheu o Honda com base na fama de confiabilidade que a marca tem no Brasil. “Vários amigos tiveram carros dessa montadora e nenhum nunca reclamou de problemas.” Ouvimos 20 proprietários e ex-donos de modelos de Honda e Toyota. Nesse universo, apenas dois disseram ter tido experiências ruins – ambos com a Honda.
Razões. Os produtos da Honda e, principalmente, da Toyota, quase nunca são considerados os melhores pela crítica especializada. Em geral, os motivos que os levam a despertar o desejo do consumidor são intangíveis. “O cliente não considera como custo apenas o valor que paga pelo zero-km”, diz o professor José Roberto Ferro, presidente do Lean Institut Brasil, que atua na área de gestão. “Na conta, está todo o ciclo de vida, que inclui consumo de combustível, gastos com manutenção e valor de revenda”, diz.
Segundo o especialista, esses custos são mais baixos no caso de veículos da Honda e da Toyota, embora em geral a tabela do novo seja mais alta que a dos rivais. “Há marcas com carros mais em conta, mas essa diferença acaba sendo compensada nos custos de manutenção e peças mais caros.”
“A última coisa que o cliente quer é voltar à concessionária, e planejamos nossos produtos para que isso não ocorra”, diz o gerente-geral de produto da Toyota do Brasil, Roger Armellini. “Se ele tiver algum problema, a filosofia da Toyota é resolvê-lo da primeira vez”, afirma. O executivo diz que os concessionários formam uma espécie de clube, no qual é quase impossível entrar. “São 71 grupos (donos de 229 autorizadas no País), que estão com a Toyota desde o início e entendem nossa filosofia.”
Bom valor de revenda é diferencial. A desvalorização dos carros da Honda e da Toyota costuma ser menor que a da concorrência, especialmente no primeiro ano de uso. Ante a tabela do zero-km, (linha 2018), o preço médio de um Corolla XEi 2017 sofre cerca de 9% de depreciação, segundo a pesquisa publicada às quartas-feiras no Jornal do Carro. Mesmo tendo recebido atualizações, o que tende a desvalorizar o modelo anterior, o Corolla é o sedã médio que menos perde preço no primeiro ano. Para comparação, o Chevrolet Cruze LTZ se desvalorizou, em média, 13,12% no período e o Nissan Sentra SL, 16,7%.
Nos modelos 2015 ante os 2016 – anos em que nenhum desses três modelos recebeu alterações importantes –, a depreciação média do Corolla é de 7,37%, ante 10,5% do Cruze e 12,3% do Sentra.
No caso do Honda HR-V, a perda média no primeiro ano de uso é de 8,7%. Para comparação, o Ford EcoSport Freestyle 1.6 depreciou 10,6% no mesmo período.
Segundo o gerente de produto da Toyota, Roger Armellini, a menor desvalorização dos carros da marca tem a ver com os baixos custos de manutenção, mas também com a estratégia de mercado adotada pela empresa. “Dificilmente damos descontos no zero-km, pois essa prática, adotada por outras montadoras, acaba resultando em depreciação do seminovo.” Ele concorda que alguns carros da marca são mais caros que os rivais. Apesar disso, o Corolla foi o quinto carro mais vendido do País em 2016 e a picape Hilux lidera as vendas do segmento.
5 RAZÕES PARA COMPRAR: CONFIABILIDADE MECÂNICA
O Corolla é um bom exemplo de que a fama de confiabilidade mecânica da Toyota se justifica. Se for bem cuidado, o carro não dá dor de cabeça e só vê a cor da oficina na hora da revisão.
5 RAZÕES PARA COMPRAR: ESPAÇO
A cabine, espaçosa, entrega o conforto que se espera de um bom sedã médio (ainda que os passageiros muito altos possam ter alguma dificuldade para viajar no banco traseiro). A capacidade do porta-malas, de 470 litros, é mais que honesta.
5 RAZÕES PARA COMPRAR: CÂMBIO CVT
Para os apreciadores desse tipo de transmissão, o Corolla é um prato cheio, com um dos melhores CVTs do mercado. Com funcionamento suave, permite ao carro desenvolver velocidade sem elevar demais as rotações do motor, o que se traduz em baixo nível de ruído e maior economia de combustível.
5 RAZÕES PARA COMPRAR: PÓS-VENDA
A rede autorizada Toyota dá um show quando o assunto é pós-venda, com procedimentos internos rigorosos para prestar um atendimento sempre correto e atencioso ao cliente. A coluna Defenda-se, publicada às quartas no Jornal do Carro, chega a receber mensagens elogiosas de leitores que tiveram até reparos sem ônus fora da garantia, tudo para manter sua satisfação com a marca.
5 RAZÕES PARA COMPRAR: POUCA DESVALORIZAÇÃO
OK, é verdade que carro não deve ser visto como investimento, já que é um bem que inevitavelmente vai se depreciar com o tempo. Mas você vai perder menos dinheiro com um Corolla, que tem ótima aceitação e valor de revenda no mercado de usados.
5 RAZÕES PARA NÃO COMPRAR: PREÇO
A tabela do sedã médio é excessivamente salgada pelo que ele oferece. A versão de entrada, GLi, custa R$ 90.990 e não traz nem mesmo faróis de neblina. A de topo, Altis, a R$ 114.990, já encosta no preço de um Audi A3.
5 RAZÕES PARA NÃO COMPRAR: FALTA DE TURBO
Em termos de motores, o Corolla fica devendo em modernidade, sobretudo pela falta de opções com turbo. Há dois propulsores, ambos aspirados: um 1.8 de 144 cv e um 2.0 de 153 cv. Graças ao turbo, VW Jetta e Chevrolet Cruze conseguem entregar potências semelhantes à do 2.0 do Corolla usando motores de 1,4 litro, mais eficientes e econômicos. Já a gama do Honda Civic tem um 1.5 turbo de 173 cv.
5 RAZÕES PARA NÃO COMPRAR: DESENHO DO INTERIOR
As linhas do painel têm estilo pra lá de ultrapassado, destoando completamente do visual externo do sedã. Detalhes como o relógio digital abaixo dos difusores centrais de ar remetem a modelos dos anos 1980 e 1990 (alguém aí falou em Ford Del Rey?)
5 RAZÕES PARA NÃO COMPRAR: PRAZER AO DIRIGIR
Quem aprecia um estilo de condução mais esportivo pode acabar achando o Corolla meio chocho e ficar frustrado. O câmbio CVT tira boa parte do prazer de acelerar, enquanto a suspensão que privilegia demais o conforto parece confirmar a fama de "carro de tiozão".
5 RAZÕES PARA NÃO COMPRAR: EQUIPAMENTOS
Nota-se certa avareza na oferta de equipamentos, típica de algumas marcas japonesas no Brasil. Até bem pouco tempo atrás, o Corolla não oferecia controle de estabilidade, lacuna só suprida na linha 2018. Ainda fazem falta ar-condicionado de dupla zona e assistentes eletrônicos, como sensor de obstáculos dianteiro e alerta de ponto cego - presentes no Cruze, por exemplo.
Confiabilidade é o destaque e falta de itens, o ponto fraco. Ouvimos 20 proprietários e ex-proprietários de veículos da Honda e da Toyota. Do total, 18 disseram que gostariam de ter outro carro dessas fabricantes. Entre as marcas mais citadas como desejadas por esses consumidores, caso tivessem de optar por outra, estão as de luxo, como Mercedes-Benz e BMW, e a Hyundai.
Entre os motivos que levaram à compra, as respostas foram quase unânimes: confiabilidade dos produtos, alto valor de revenda e manutenção barata. “Estou no segundo Corolla e escolhi o carro pela durabilidade, economia e valor de revenda”, diz o engenheiro Gustavo Orsatti.

Os pontos mais criticados dos produtos da Toyota pelos clientes são o design, considerado muito conservador, e a baixa oferta de itens tecnológicos na comparação com os concorrentes diretos. “O Corolla não vinha com controle de tração até a linha 2018”, diz o médico veterinário Claudio Barbosa, que tem um modelo 2015 do sedã médio.
Da Honda, há queixas quanto ao acabamento interno e também em relação à oferta de itens de série, em geral menor que a dos rivais. “O principal ponto negativo é a falta de modernidade. Meu carro é de topo da linha, mas deixa a desejar em muitos itens, como a partida (do motor) por botão (que não é oferecida)”, diz a publicitária Carla Zimmer, dona de um Honda HR-V. “Não gosto do desenho do interior”, diz a administradora Christiana Mello, que tem um CR-V.
Outra queixa recorrente dos donos de modelos das duas marcas de origem japonesa é o preço do zero-km. “É muito alto”, diz o consultor comercial Lauro Bernardes, dono de um Civic.
Honda tem boa fama e satisfação mediana. Com fama de excelência entre os consumidores, a Honda não está bem posicionada no ranking de nível de satisfação da J. D. Power. Além disso, as críticas à marca são mais comuns que as feitas à Toyota. Embora seja algo raro, a montadora já esteve no ranking de queixas da seção “Defenda-se”.
Para o professor José Roberto Ferro, do Lean Institut, a posição mediana da Honda no ranking de satisfação da consultoria norte-americana pode ser resultado da atuação de algumas concessionárias.
Estudioso do setor automobilístico, ele diz que algumas concessionárias – especialmente no interior do Brasil – deixam a desejar e a rede tem atendimento inferior ao da Toyota. A Honda não quis se pronunciar sobre o assunto.
O engenheiro Decio Franco está entre os consumidores que tiveram problema em uma autorizada da Honda. O motor de seu Civic fundiu com menos de 10 mil km rodados e o reparo em garantia foi negado. Os técnicos da oficina alegaram que a falha ocorreu por causa de uso de combustível adulterado, o que Ribeiro nega. O orçamento para o conserto ficou em R$ 14 mil e o engenheiro abandonou a marca. Ele diz que está feliz com seus atuais carros da Hyundai.

A favor, os modelos da Honda têm apelo mais emocional que os da Toyota. “A Honda investe mais em design para chamar atenção, enquanto a Toyota é conservadora”, diz Ferro. Dos proprietários de Honda entrevistados, muitos disseram que não comprariam um carro da Toyota justamente por causa do desenho, considerado pouco atraente.
Metodologia. A pesquisa da J. D. Power sobre nível de satisfação dos consumidores, batizada de Costumer Service Index (CSI) é feita de modo online. A versão mais recente contou com a participação de 5 mil consumidores. A escala de pontuação é de um a 1.000, e os participantes avaliam quesitos relacionados à percepção sobre o produto e a rede de concessionárias. Segundo a consultoria, a experiência de pós-venda é fundamental para a fidelização do cliente