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Como dois Mercedes chegaram às mãos de ditador da Coreia
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Como dois Mercedes chegaram às mãos de ditador da Coreia

Complexa rede de empresas foi usada para furar embargo à Coreia e entregar os Mercedes-Maybach a Kim Jong Un

Igor Macário, com The New York Times

19 de jul, 2019 · 8 minutos de leitura.

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Mercedes é visto durante parada em Pyeongyang
Crédito:Foto: Pyeongyang Press Corps/Pool via Reuters
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Dois Mercedes-Maybach são as novas jóias da frota do ditador norte-coreano Kim Jong Un. Isso apesar das sanções internacionais para que itens de luxo não sejam entregues na Coreia do Norte. O líder do país circula em Pyongyang e em outras cidades do mundo a bordo de opulentos sedãs da marca alemã. Para saber como os carros chegaram às mãos dele, o jornal The New York Times fez uma extensa investigação.

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Os carros são usados, um da versão blindada S600 Pullman Guard e outro Maybach 62S. Cada um está avaliado em cerca de US$ 500 mil. Na conversão direta, isso dá cerca de R$ 1,9 milhão. Trata-se do modelo mais caro da Mercedes-Maybach, a divisão de alto luxo da marca alemã. Uma unidade zero-km custa, na Europa, 1,4 milhão de euros. São cerca de R$ 6 milhões (na conversão direta).

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A investigação do jornal teve apoio do Centro de Estudos Avançados de Defesa. Trata-se de um grupo norte-americano sem fins lucrativos que monitora redes de contrabando.

Coreia do Norte sob embargo

Os dois Mercedes-Maybach chegaram à Coreia do Norte por meio de um complexo quebra-cabeças. O sistema de transferências portuárias utilizou transportadoras secretas e empresas-laranja. A Coreia do Norte enfrenta bloqueios à importação de bens de luxo desde 2006. A ONU impôs as sanções a pedido do então presidente dos EUA, George W. Bush.


Kim Jong Un, no entanto, continua desfilando a bordo de carros de luxo. Ele roda dentro e fora da Coreia do Norte, desafiando as sanções. As técnicas utilizadas para importar bens de luxo são as mesmas adotadas para a entrada de outros itens. Isso inclui peças e tecnologia para o criticado programa de armas nucleares do país.

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Foto: Korea Summit Press Pool via The New York Times

Longa viagem

A viagem do par de S600 Pullman Guard ao leste asiático começou em junho de 2018. O porto de partida foi Roterdã, na Holanda. Cada carro chegou ao local em caminhões não identificados.


Os sedãs ficaram sob os cuidados da China Cosco Shipping Corp. Não há registros que indiquem quem os comprou. A própria Daimler, controladora da Mercedes-Benz, informou ao jornal que checa informações sobre os potenciais compradores desse tipo de modelo. O objetivo é também evitar que os veículos não sejam enviados a países com sanções.

De Roterdã, os carros viajaram por 41 dias até Dalian, no norte da China. No porto, bem próximo da Coreia do Norte, ficaram parados por quase um mês. De lá, embarcaram em outro navio para Osaka. Do Japão, partiram para Busan, na Coreia do Sul.

Apesar de misteriosamente terem circundado o país de destino algumas vezes, a viagem ganhou contornos obscuros após a parada em Busan. Os carros foram embarcados novamente em outro navio, o DN5505, de bandeira do Togo. O navio com registro no país africano partiu rumo a Nakhodka, no extremo leste da Rússia.


Foto: Korea Summit Press Pool via The New York Times

Paradas obscuras

Nesta parte da viagem, os carros estavam sob os cuidados da Do Young Shipping, dona do DN5505. Aparentemente, a empresa está ligada a um executivo russo, apesar de ser registrada nas Ilhas Marshall, na Micronésia. O DN5505 passou a ser de propriedade da Do Young apenas dois dias antes da chegada dos carros à China.

Após zarpar de Busan, o sistema de identificação automática do DN5505 foi desligado. Essa prática costuma ser utilizada por navios que estão violando sanções internacionais. O levantamento feito pelo Centro de Estudos Avançados de Defesa não conseguiu identificar o caminho dos carros a partir daí.


O sinal voltou a ser transmitido após 18 dias. O navio estava em águas sul-coreanas, fazendo o caminho contrário – e sem os Mercedes. Registros da aduana sul-coreana mostram que o DN5505 havia parado em Nakhodka, de onde partiu carregado com carvão.

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Foto: Korea Summit Press Pool via The New York Times

A chegada a Pyongyang

A reportagem informa que as limousines podem ter ido de avião para a Coreia do Norte. Três cargueiros da Air Koryo, a estatal de aviação norte-coreana, pousaram em Vladivostok no mesmo período em que o  DN5505 ancorou em Nakhodka. As duas cidades são próximas. Há registros em vídeo e dados de rastreamento de aeronaves que confirmam essa movimentação.


São raros os pousos em Vladivostok de aviões de carga vindos de Pyongyang. As datas de permanência dos cargueiros da Air Koryo na cidade coincidem com a passagem do navio com os Mercedes pela região.

Em janeiro, Kim Jong Un circulou pela capital norte-coreana em um S600 Pullman Guard. O ditador chegou à sede do Partido dos Trabalhadores a bordo do sedã da Mercedes-Maybach. Também há fotos oficiais do líder do país nas quais o modelo aparece.

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