Foi em uma despretensiosa viagem para trabalhar em uma estação de esqui em Vermont, no nordeste dos Estados Unidos, que a jornalista Christiane Kokubo acabou encontrando o professor de espanhol Nate Shepard. Se passaram nove anos entre o primeiro contato, em 2003, e a mudança de Christiane para Vermont, motivada pelo cansaço da vida na cidade de São Paulo e, obviamente, pelo amor.
Agora no frio do Estado americano, a jornalista trocou de profissão e passou a trabalhar, junto com Nate, como intérprete da Open Door Clinic, clínica médica que atende americanos sem condições de aderir a planos de saúde e mexicanos, que atravessam o país para trabalhar nas fazendas de leite da região e não podem entrar no sistema por não terem registro. A jornada foi batizada de “From Home Para Casa”, uma brincadeira com os idiomas nativos da dupla.
Foi o contato com esse povo que incentivou Christiane e Nate a realizarem uma viagem partindo da terra natal do americano com destino à terra da brasileira, com a intenção de arrecadar 1 dólar para a clínica a cada um dos 50 mil quilômetros que serão percorridos. Para isso, ambos economizaram e pediram licenças de um ano de seus empregos.
O plano inicial era ir com um Suzuki SX4 até a Califórnia, vendê-lo e fazer o resto do trajeto de bicicleta, mas, após as magrelas terem sido roubadas em Austin, no Texas, e nenhum comprador ter se interessado quando o veículo foi listado em San Diego, o casal resolveu efetivá-lo como companheiro na aventura.
Christiane destaca que o objetivo da viagem é chamar atenção de um tema que vem se destacando nos últimos tempos. “Vamos tentar não só fazer uma viagem, mas para atrair uma atenção para uma causa importante, que é a imigração e a mobilidade das pessoas”.
As paradas ao longo do percurso são feitas, em sua maioria, em casas de parentes ou amigos de amigos. A rede criada por Nate e Christiane é tão extensa que La Paz, na Bolívia, é a segunda capital de todos os 14 países em que já passaram que precisaram se hospedar em um hotel. A outra foi a Cidade do Panamá. A dupla ressalta a receptividade de seus anfitriões. “As pessoas abrem as casas como se fossemos membros da família ou amigos de anos”.
Companheiro. O Suzuki SX4, que deveria ter ficado no meio do caminho, vem aguentando bravamente a jornada. A única grande alteração foi feita na Cidade do México, onde um marceneiro instalou uma cama na parte traseira. O carro também passou por uma troca nos amortecedores dianteiros na Guatemala e por breves revisões e trocas de óleo.
A direção, como contam, é alternada. Em terrenos irregulares e montanhosos, quem assume é Nate. Quando chegam às metrópoles, abarrotadas de carro e barulho, Christiane pega o volante. “Quando fica muito cheio, ela lida bem com isso”, diz o americano.
O convívio com o carro por quase quarenta mil quilômetros mudou os planos originais, que incluíam a venda do veículo quando chegassem à capital paulista. Agora, Nate e Christiane já estão procurando maneiras de enviar o SX4 de volta para Vermont.
Aprendizado. A jornada de um ano vivida por Nate e Christiane, de acordo com a brasileira, adicionou uma camada importante ao relacionamento vivido pela dupla: a da paciência.
A convivência em praticamente todos os momentos, segundo ela, exige que essa virtude seja praticada “não só um com outro, mas com as pessoas, as situações e os locais que a gente encontra“.
Para o professor de espanhol, o percurso adicionou vivências com povos latinos que poderão ser levadas para a sala de aula. Nate chegou, inclusive, a encontrar uma ex-aluna, que está fazendo intercâmbio na Costa Rica.
A jornada também dará forças para voltar à rotina, já que “cada pessoa que conhecemos pelo caminho nos inspiram para novos projetos, sejam em casa ou pela estrada”, afirma Christiane.