Ezequiel Daray / Car News
“O Brasil tem as condições para o crescimento. Mas o protecionismo pode ser muito negativo”. A declaração é de Dieter Zetsche, CEO da Mercedes-Benz. Um dos homens mais influentes da indústria automobilística mundial, ele já morou no Brasil e, em entrevista concedida durante o Salão de Detroit (EUA), revelou os planos da montadora alemã no País.
A quantas anda o projeto da Mercedes para voltar a fabricar carros no Brasil?
O segmento de carros de luxo ainda é limitado no mercado brasileiro. Isto torna mais fácil atingir o volume necessário para tornar possível uma fábrica. Temos a opção de fazer aliança com a Renault-Nissan, mas ainda não estamos analisando o assunto. Dito isso, eu ficaria muito desapontado se o governo tratasse a todos de forma igual, sem considerar que temos uma história de 50 anos de investimentos e empregos gerados no Brasil. Não merecemos o mesmo tratamento que outras empresas que apenas importam e vendem veículos.
O que poderia afetar suas decisões?
Quando a crise estourou, pensei que o protecionismo poderia surgir como resposta, o que não ocorreu em grande escala. Mas nos últimos tempos temos visto isso aparecer fortemente na Argentina, em seguida no Brasil e, em menor medida, na Turquia. Aprendemos, ao longo da história, que quanto mais livre é o comércio, maior o desenvolvimento. Até entendo que, em alguns curtos períodos, indústrias jovens precisem de proteção. Mas, no longo prazo, sem concorrência externa nunca se cria um padrão de qualidade. Quando isso ocorre em muitos setores, é extremamente perigoso. Os países mais abertos tornam-se mais desenvolvidos a longo prazo.
O que o senhor pensa sobre o futuro dos mercados emergentes como a China, a Índia ou o Brasil? Vão continuar crescendo?
Depois de muitos anos lutando para reduzir o abismo que os separava dos países desenvolvidos, os mercados emergentes parecem ter conseguido fazer as mudanças estruturais necessárias para acabar com as diferenças. Eu acho que há espaço para que a tendência de crescimento se mantenha. Morei dois anos no Brasil, e hoje vejo que está mais perto do que nunca de alcançar o desenvolvimento. Sempre ouvi dizer que era o “país do futuro”, mas era sempre futuro. Mas isso mudou, e é bom para o Brasil e para a indústria. É claro que há riscos no caminho. Preocupam-me muito os níveis de protecionismo em alguns desses mercados. A médio prazo, se continuar assim, vai haver um impacto forte no desenvolvimento.
Se o senhor tivesse que escolher um modelo para fabricar no Brasil, qual seria o mais adequado para nosso mercado?
Um de nossos carros compactos, obviamente. Poderiam ser vários modelos, uma vez que, quando se faz o investimento numa plataforma, não é difícil produzir dois ou três diferentes. No Brasil, como nos Estados Unidos, os modelos três-volumes têm grande demanda, então um modelo como o CLA poderia ser indicado. Mas ele tem linhas de cupê e não é tão espaçoso. Seria mais sensato pensar na segunda geração, em duas e quatro portas, com uma plataforma projetada para o mercado brasileiro. Sei também que os utilitários-esportivos são bastante atraentes para o mercado brasileiro
Que lição a Mercedes-Benz aprendeu com a fabricação da primeira geração do Classe A no Brasil?
Você tem que ser realista sobre o poder de compra do mercado. Saber exatamente qual parcela da população pode comprar um carro do segmento premium. E também considerar a estrutura de custos que pode ser alcançada, com base na cadeia de autopeças do Brasil, e com um volume de produção limitado. Isso dá uma ideia realista do custo, e temos que ver se ele corresponde a um preço de mercado igualmente realista. Não vamos repetir o erro de embarcar em um projeto com estrutura pouco realista de custos e volumes. Este foi o erro que cometemos: pensávamos que um volume de 50 mil unidades por ano era possível, e estávamos muito longe disso.
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