Recentemente, a Ford completou um século de Brasil. Porém, ao invés de comemoração, a marca vem amargando derrota atrás de derrota desde 2019, quando fechou a planta de São Bernardo do Campo (SP). Agora, nesta segunda-feira (11), foi anunciado o fim da produção nacional, com o fechamento das unidades de Camaçari (BA), Taubaté (SP) e da fábrica da Troller (CE). A alegação são as perdas significativas acumuladas por questões como pandemia, capacidade ociosa e redução de vendas.
Apesar de demitir cerca de 5.000 empregados, a gigante do oval azul promete manter importantes setores como engenharia e o Campo de Provas de Tatuí (SP), além de continuar com as vendas de carros, porém, importados. Mas fica a pergunta: “O fim da produção de EcoSport, Ka, Ka Sedan e Troller T4 pode afetar o consumidor?”
A marca garante em nota que não. “A Ford estará ativamente presente no Brasil com sua rede de concessionários e continuará honrando a garantia de seus veículos, oferecendo assistência total ao consumidor com operações de vendas, serviços, peças de reposição, normalmente, após a garantia”. Os modelos continuam em vendas até que durem os estoques.
Consumidor Ford teme desvalorização
Mas os consumidores estão com medo. A contadora Marina Ventura comprou um Ford EcoSport há duas semanas. “Achei a compra perfeita. Me atendia em todos os requisitos, principalmente, economia. Mas, agora, com essa notícia (do fechamento das fábricas da Ford no País), acredito que todo o meu investimento vá por água abaixo. O que faço?”, questiona.
Já para Jéssica Lemos, que após meses de pesquisa, pegou seu Ka em setembro último, afirma que está super feliz com o carro, porém, agora preocupa-se com a saída da Ford. “Tenho medo do aumento da desvalorização, falta de peças e dificuldade para a realização de revisões, sem contar a possibilidade de elevação no preço do seguro. Será que pode haver alteração?”, questiona.
Respostas
Em resposta às dúvidas destas e de tantos outros consumidores, o consultor automotivo Paulo Garbossa, da ADK Automotive, esclarece que nada muda. Ele argumenta que o consumidor é a parte menos afetada nessa história. “Quem, realmente, perde com o fechamento das atividades nas fábricas da Ford é a economia do Brasil, principalmente, com a perda de milhares de empregos diretos e indiretos que isso vai causar”.
Ele ressalta que a Ford, “não está saindo do Brasil, mas apenas fechando uma parte das atividades”. Assim como aconteceu com a Mercedes-Benz, que fechou as portas da fábrica de Iracemápolis (SP), deixando de produzir o SUV compacto GLA e o sedã médio Classe C, o cenário real permanece inalterado. “A fábrica fechou, mas os carros continuam sendo importados e eles (a Mercedes-Benz) continuam trazendo peças de reposição.”
Garbossa explica que não há necessidade de preocupação, afinal, a Ford esteve no Brasil por 100 anos. Isso refletiu na produção de uma infinidade de peças de reposição. “Até hoje, por exemplo, empresas continuam produzindo peças de modelos como Corcel, Pampa (foto abaixo) e até Landau. Mesmo sem fabricação de carros no País, o mercado vai se adequando. Coloquemos aí, também, o processo de globalização que, hoje, possibilita a compra de peças pela internet, por exemplo”, explica o consultor.
Queda nas vendas e redução de concessionárias
Já o consultor Fernando Trujillo, da IHS Markit, acredita que o impacto para o consumidor não deva ser tão pequeno em termos de atendimento. “O número de concessionárias deve cair (preferiu não falar em porcentagem neste primeiro momento) por conta da queda de vendas, afinal, a partir de agora, a Ford trabalhará apenas com veículos importados e de segmentos superiores, derrubando a demanda de compra”, enfatiza.
Além de ficar mais cauteloso em relação ao pós-vendas, por questões de custos, prazos e pontos de serviço, o consumidor também passa a temer a desvalorização do carro. De acordo com Trujillo, ela de fato vai acontecer. “Mas quanto o preço vai cair? Não sabemos! Afinal, (por conta dos vários fatores envolvidos) é difícil quantificar!”, pondera.
Vale ressaltar que, quando a fabricante deixa de operar, mas mantém estrutura no país, a desvalorização de sua gama de veículos – e a velocidade do processo – é menor. Tudo é, ainda, baseado no nível de nacionalização. Essa porcentagem (de peças feitas em solo nacional) também reflete na desvalorização do veículo que saiu de linha. O processo é menor e mais lento, segundo especialistas. “O Chevrolet Corsa, por exemplo (deixou de ser fabricado em 2012), até hoje é um dos mais procurados no mercado de usados”.
Promessas se mantém
A Ford, que fechou 2020 como a quinta maior montadora do Brasil – 7,1% do mercado, de acordo com dados da Fenabrave, federação que reúne os concessionários do País -, afirma que não encerra sua história neste 11 de janeiro de 2021. A marca diz começar uma nova era.
Mesmo precisando pagar nada menos que US$ 4,1 bilhões (aproximadamente R$ 22,5 bilhões) em despesas para poder deixar as operações fabris no Brasil, a montadora continuará apostando em modelos já prometidos. Estão no gatilho Ranger, Bronco, F-150, Maverick e o SUV elétrico do Mustang, o Mach E. Porém, todos importados de países como México (parceiro comercial do Brasil) e Argentina – que também terá redução de funcionários.