O movimento feminista já tem quase meio século e a mulher ainda busca um parceiro que lhe dê espaço e segurança. Mas os critérios de escolha estão cada vez mais refinados. O companheiro fiel de tantas horas do dia, neste caso, é um carro. Se os compactos de entrada também vendem bem entre elas, são os utilitários-esportivos que despontam como os preferidos do público feminino.
Um dos atributos mais valorizados nesses modelos é a posição alta de guiar, que oferece boa visibilidade e transmite sensação de segurança. Não por acaso, hatches compactos que cumprem esse quesito, como Volkswagen Fox, Renault Sandero e Citroën C3, também são bem aceitos por elas.
Quando a família cresce, a necessidade de mais espaço pesa a favor dos utilitários, nos quais é mais fácil embarcar as crianças e seus acessórios. A administradora Carolina Toledo sempre teve carros pequenos, até que a chegada das filhas Cecília e Carmen a fez comprar um Mitsubishi ASX. “Vivo com o carro cheio. Ponho e tiro o carrinho delas o tempo todo e ainda levo a bolsa da academia e as sacolas do supermercado.”
A maternidade também traz uma preocupação maior com a segurança. A empresária Luciana Dinana passou a valorizar o controle de estabilidade, sobretudo em modelos altos, como o Chevrolet Captiva que dirige atualmente. “Meu EcoSport não tinha esse item e ‘jogava’ mais em curvas. Sem filho, a gente se acha imortal. Com criança, fica cautelosa.”
Recursos de conectividade e entretenimento ganham importância. “A mulher está no mercado de trabalho e passa mais tempo no carro. Uma central multimídia permite que ela acione aplicativos do celular com a voz e se distraia enquanto está no trânsito”, diz a supervisora de marketing da Ford, Ana Paula Salles.
Detalhes. Em clínicas de produto feitas pelas marcas, a preocupação feminina com detalhes sobressai. “Enquanto o homem busca motor, câmbio e desempenho, a mulher repara na oferta de porta-objetos, ganchos para sacolas no porta-malas, espelho no para-sol e espaço para cadeirinha”, diz o gerente de marketing do produto da Volkswagen, Henrique Sampaio.
Essas características passam despercebidas pelo homem, mas podem definir a compra de uma mulher. Por isso, um carro vitorioso deve incluir atributos para ambos os gêneros. “Uma marca precisa atender o maior número possível de pessoas. Se você oferecer apelo esportivo e também esses ‘balangandãs’, vai agradar a todos”, diz o consultor Paulo Garbossa, da ADK Automotive.
INDEPENDENTES, ELAS SÃO MAIS RACIONAIS
Com o crescimento de sua participação no mercado de trabalho, as mulheres estão cada vez mais envolvidas na escolha dos carros que dirigem. E se afirmam como consumidoras bem informadas, críticas e donas de um olhar peculiar.
Ligadas ao automóvel de uma forma menos apaixonada que os homens, elas tomam decisões mais bem pensadas. A internet é uma preciosa aliada na busca por informação. “Elas têm mais paciência para pesquisar e configurar o carro pela internet antes de ir à loja”, diz Henrique Sampaio, da VW.
A vendedora Cristina Jordan queria um modelo pequeno, mas espaçoso. Depois de comparar várias opções, escolheu o Renault Sandero. Uma análise de custo-benefício eliminou do horizonte os utilitários. “Com um carro de tamanho e potência maiores, você gasta mais com pneus, óleo, IPVA e seguro, para cumprir uma rotina em que um hatch serve muito bem”, ela justifica.
Na compra do carro familiar, a esposa vê com clareza as necessidades que devem ser preenchidas. “Além de participar das finanças do casal, é ela quem sabe o tamanho da bagagem que o porta-malas terá de levar no fim de semana”, diz Ana Paula Salles, da Ford.
Segundo pesquisas da Volkswagen, 70% das compras de carros têm alguma influência feminina. “Ai do marido ou pai que comprarem um modelo de que a esposa ou filha não gostem”, diz Sampaio.
Para o sociólogo Fábio Mariano, professor do Mestrado em Comportamento do Consumidor da ESPM, porém, esse dado deve ser visto com ressalvas, pois estaria preso a um modelo familiar tradicional. “Essa estatística não contempla as mudanças comportamentais que ocorreram. Há um numeroso público formado por homens e mulheres solteiros, viúvos, divorciados, homossexuais”, pondera. “E, nos casais, hoje cada um escolhe o próprio carro.”
‘CARRO DE MULHER’ É RÓTULO EVITADO PELAS MARCAS
Mesmo atentas aos gostos das consumidoras, as marcas não desenvolvem produtos pensando especificamente no público feminino – e tentam evitar que um modelo receba a pecha de “carro de mulher”.
“A mulher detesta ser estigmatizada. Ela não quer um carro cor-de-rosa”, diz Ana Paula Salles, da Ford. “Não vou determinar que um modelo é para este ou aquele gênero, ou fazer uma campanha só para elas. Tenho de atingir toda a massa. Picapes e esportivos atraem mais os homens, mas um compacto tem de ser neutro.”
O professor Richard Vinic, coordenador do curso de pós-graduação em Marketing da FAAP, explica que, hoje em dia, os papéis sociais do homem e da mulher não são mais tão definidos e rígidos, o que torna inviável criar estratégias por gênero para um produto.
“Mais importante é o estilo de vida: identificar a categoria do produto e o momento de vida do seu público”, diz. “O que a mulher de hoje quer são soluções que facilitem sua rotina.”
Henrique Sampaio, da VW, afirma que estigmatizar um modelo pode desvalorizá-lo, afugentando compradores. Nada impede, porém, que o carro ganhe contornos mais femininos pelas mãos da própria cliente. “Um celular não sai de fábrica pintado de rosa, mas a mulher pode colocar uma capa colorida depois. Um veículo pode ser personalizado com apliques, por exemplo.”
Na opinião do professor Fábio Mariano, as noções de “carro de homem” e “carro de mulher” são fechadas em uma estrutura familiar e social antiga, que mudou. “O Land Rover Evoque, apesar da cara ‘durona’, tem agradado as mulheres, que não querem mais carros ‘fofinhos’. Uma minivan pode ser comprada por um homem sozinho, divorciado, para passear com os filhos.”