O Corcel ano 1977 que o bancário Rafael Moreira dirige não é apenas o registro de um passado distante da indústria automobilística brasileira. O Ford também eterniza a relação de afeto que ele construiu por mais de 20 anos com seu avô, a quem o modelo pertenceu.
“Meu avô comprou o carro zero-km para poder trabalhar como motorista de uma advogada, depois que um acidente o fez abandonar a vida de caminhoneiro. O trabalho acabou não se concretizando, mas ele se apaixonou pelo Ford e ficou com ele”, conta Moreira.
O amor do neto pelo Corcel também surgiu de forma espontânea. Era no Ford que o avô o levava para passear, desde os primeiros anos de vida.
Em pouco tempo, o garoto, hoje com 27 anos, já estava cuidando do carro, que inclusive lavava como se fosse dele. “Dos dez netos, eu era o único que se interessava pelo Corcel”, ele diz. “Eu gostava muito do carro e meu avô sabia disso.”
Diante de tanta dedicação, assim que chegou à maioridade o bancário recebeu o cupê de presente. O avô pediu apenas que ele continuasse cuidando bem do carro. E Moreira seguiu a orientação à risca.
“Fiz questão de preservar tudo como o meu avô deixou, incluindo os santinhos que ele, que era muito católico, mantinha afixados no painel”, explica o neto. “Manual do proprietário, chave reserva e até a nota fiscal de compra permanecem intactos até hoje.”
Os dois fizeram muitos passeios juntos a bordo do Corcel, até o avô falecer, em 2013. No som, tocavam duplas de música caipira, como Milionário & José Rico, outra paixão que foi herdada pelo neto.
Com cerca de 90 mil km rodados, o cupê sempre teve vida mansa. Poupado do uso diário, era usado pelo primeiro dono principalmente em viagens, para o litoral paulista ou a cidade de Aparecida do Norte, no interior do Estado de São Paulo.
Foi também nas mãos do avô que o Corcel ganhou alguns toques de modernidade: rodas esportivas, vidros elétricos e novos bancos dianteiros.
Ritual
Todas as sextas-feiras, o Ford sai de uma garagem alugada no centro da capital e vai para a casa do bancário, no Brás, bairro da zona leste. O carro é lavado, encerado, roda por algumas horas e, no domingo à noite, volta para a garagem. Para Moreira, esse ritual funciona como uma espécie de terapia.
“Meu trabalho é muito cansativo. O que me acalma é entrar no Corcel, limpá-lo, ligar o motor, sentir o cheiro de gasolina. Saio do carro renovado, sem estresse”, ele conta.
Pelas ruas da cidade, o tom “Vermelho Mustang” da carroceria faz com que o Ford chame a atenção por onde passa. E rende a Moreira elogios, novas amizades e algumas propostas.
“Já chegaram a me oferecer R$ 50 mil pelo Corcel. Mas vou mantê-lo pelo resto da vida, pois tenho um afeto muito grande por ele. Pretendo deixá-lo para os meus filhos e netos”, afirma o bancário. “Eu entro nesse carro e me lembro da família indo viajar, foi uma época muito boa. E guiá-lo me enche de orgulho, pelo fato de meu avô tê-lo confiado a mim.”