Quando o DeLorean DMC-12 apareceu pela primeira vez na tela do cinema, em De Volta Para o Futuro, o pequeno Fernando Silotto, então com oito anos de idade, teve uma epifania.
O protagonista do filme, Marty McFly, que tocava guitarra, andava de skate e viajava pelo tempo, virou o herói do garoto. Assim que terminou de ver o longa, o menino pacato, que tocava violão nas horas vagas, pediu para a mãe lhe comprar uma guitarra e um amplificador – mais tarde, ele fundaria uma banda de rock e viraria músico profissional.
O culto ao filme prosseguiu na adolescência. Em uma visita a um parque temático em Orlando, nos Estados Unidos, Silotto viu o exemplar de DeLorean usado nas gravações e comprou algumas miniaturas. Quando foi convidado para uma festa à fantasia, não teve dúvidas: correu para um brechó e montou um “look Marty McFly”. Até então, para ele o DeLorean era um carro fictício, de um filme que havia marcado sua vida.
A fantasia começou a virar realidade em 2013. O imóvel vizinho à casa onde Silotto e sua banda ensaiavam foi vendido e o novo dono passou a guardar seus carros antigos ali. Sob uma das capas, o vocalista do grupo reconheceu um DeLorean.
Naquele momento, Silotto descobriu que o carro do filme era “de verdade” – e, imediatamente, pensou na ideia de ter um exemplar.
“Eu ainda estava consolidando a minha carreira, minha esposa estava grávida e, como nunca havia tido um antigo, fiquei com medo”, diz o músico.
Como a ideia não saía de sua cabeça, ele decidiu ver se o sonho era viável. Procurou uma importadora, mas descobriu que, por ali, o passo seria maior do que podia dar. Começou a vasculhar a internet e encontrou dois exemplares à venda no Brasil.
Para ver o primeiro carro, ele teve de viajar a Caxias do Sul, no interior gaúcho. “Quando o dono chegou com o DeLorean, eu tive um choque”, ele lembra. “Dirigi o carro o dia inteiro e fiquei balançado, mas não conseguimos chegar a um valor que fosse bom para ambos.”
O segundo DeLorean estava em Santos, no litoral paulista. Fabricado em 1981, tinha apenas 58 mil km rodados. Inexperiente, o músico achou melhor contratar uma vistoria especializada para descobrir quanto teria de gastar em reparos para deixá-lo em boas condições.
“Ele até rodava, mas com a direção batendo e a embreagem dura. Usei isso na negociação com o proprietário”, diz Silotto, que fechou negócio em outubro de 2016. “Para minha sorte, não tive de trocar a caixa de direção, mas apenas apertar uma bucha plástica que estava solta.”
Independente. Logo de cara, também foi preciso trocar a embreagem, revisar os freios e repor o gás do ar-condicionado. Quando surgiram outros problemas, Silotto resolveu se embrenhar em fóruns virtuais de proprietários do DeLorean, e descobriu dotes inesperados.
“Os norte-americanos seguem muito a filosofia ‘do it yourself’ (faça você mesmo) e fui absorvendo isso. Já troquei relês, reparei a ventoinha do radiador e os amortecedores das portas. Enfim, coisas que dá para fazer em casa”, ele diz. “É fácil achar peças do DeLorean lá fora, e isso foi decisivo para eu me animar a comprá-lo.”
No começo, Silotto estranhou a posição de dirigir do modelo, bem baixa. Mas logo se adaptou. “Sou suspeito para falar, mas ele é maravilhoso. O motor V6 de apenas 135 cv não tem tanto torque em saídas, mas depois deslancha e desenvolve bem em rodovias”, opina.
O músico também teve de se acostumar com a comoção que o carro desperta em outros fãs de De Volta para o Futuro. “É um assédio do bem, emocional. É como se as pessoas estivessem reencontrando um velho amigo, pois o DeLorean era quase um personagem do filme.”
Já as gerações mais novas, que nem sempre conhecem o longa, se impressionam com o visual “diferentão” do modelo, com portas do tipo asas de gaivota.
“É legal poder dividir com outras pessoas o que senti quando vi o DeLorean pela primeira vez, fazê-las ter a mesma emoção. Era um sonho muito distante, que eu consegui realizar.”