Blog do Boris

Fim das concessionárias de automóveis?

Vou começar a pensar em outra profissão, pois o futuro do jornalista que escreve sobre automóveis também é sombrio...

Boris Feldman

02 de jul, 2018 · 6 minutos de leitura.

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Venda de carro

O que devem ter pensado os fabricantes suíços quando sugiram os primeiros concorrentes japoneses produzindo relógios de extrema precisão, acionados por minúsculas baterias e custando alguns poucos dólares?

Provavelmente  previram a derrocada da relojoaria suíça. Ou pensaram em mudar de ramo. Mas o futuro foi muito mais risonho do que imaginaram e nunca seus relógios foram tão cobiçados no mundo inteiro, diante de uma mudança conceitual que os  transformou em joias, ou objetos de coleção. Aliás, a rigor, ninguém nem precisa mais de um relógio no pulso, pois até o mais mambembe dos celulares informa corretamente as horas.

Este foi o raciocínio de uma fábrica europeia de automóveis premium numa recente convenção com proprietários de concessionárias, preocupados com as ameças e consequência do carro autônomo. Um diretor da fábrica comentou que o foco da empresa era no design de produtos cada vez mais sofisticados, sem deixar de acompanhar a evolução técnica, eletrificação e conectividade dos automóveis. Mas previa complicações para as grandes multinacionais do setor, as chamadas “generalistas”, que baseiam a quase totalidade de seu faturamento em carros compactos e acessíveis. Disse não ter dúvida de que os clientes de seus automóveis, caros e sofisticados, terão eternamente o desejo do objeto de luxo. Seja relógio ou carro.

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Faz lembrar uma história semelhante no Brasil. A Puma vinha de vento em popa no início dos anos 70 com seus esportivos com mecânica do Fusca. Quando a Volkswagen confirmou o lançamento de seu próprio esportivo, o SP2, foi um deus-nos-acuda entre os diretores da Puma. Certos de que não teriam chance de enfrentar um concorrente da toda-poderosa germânica, correram para projetar outro esportivo, capaz de superar o VW SP2 em seu ponto fraco, a minguada potência do motor do Fusca.

Lançaram o Puma Chevrolet com o baita motor seis cilindros do Opala, mas um desastre em termos de suspensão, acabamento, etc. Entretanto, imaginaram jamais que iriam bater recordes de faturamento logo depois do lançamento do SP2: quase todos que o compravam se decepcionavam e optavam pelo carro da Puma, artesanal, exclusivo e de maior performance, pois oferecia diversas opções de motorização e câmbio.

Se o raciocínio do diretor da fábrica de carros premium estiver correto, como será o futuro das generalistas? O mercado vai sofrer uma mudança radical e a primeira baixa sensível será das concessionárias, pois suas vendas irão definhar. Seus clientes, ao invés de comprar um carro, irão apenas se cadastrar numa empresa de compartilhamento e a ter direito de uso.  Apanha um carro (elétrico) num estacionamento e o devolve horas ou dias depois no mesmo ou em outro local. Será debitado pelo tempo ou quilometragem rodada.


Então, a previsão é de que Ferrari e Rolls Royce continuam a ser produzidos e comercializados em concessionárias. Mas, Gol e Palio sumiriam do mapa, assim como suas redes de revendas.

Eu mesmo já vou pensar em outra atividade profissional, pois quantos automóveis vão sobrar para serem testados, além dos premium? Como será o test-drive de um carro autônomo, ou para compartilhamento,  fabricado pela Volkswagen, Fiat ou Renault exatamente de acordo com as especificações da Uber, Google ou da “Localiza Share a Car”?

O prêmio de consolação é que muitas outras profissões serão extintas ou modificadas: motoristas, tratoristas, maquinistas, pilotos de testes, manobristas, frentistas de postos, mecânicos, taxistas…


Turbulências como essa já existiram no passado. Mas nunca tão radicais como essa que se aproxima.

 

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