Blog do Boris

Ilegal o Peugeot do ‘barraco’ no Rio com duas mulheres de biquíni?

Nos surrealismos da legislação brasileira, dirigir de biquíni e descalço pode. Mas sandália de dedo não pode...

Boris Feldman

05 de out, 2020 · 6 minutos de leitura.

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A história viralizou e metade do Brasil viu o vídeo do 308 conversível (CC) com duas mulheres voltando da praia se beijando numa movimentada rua do Leblon, no Rio. E uma delas levando uma garrafada de uma terceira que não gostou do que viu.

Sob o aspecto moral, a garrafa voadora dispensa comentários. Mas à luz da legislação de trânsito, o Peugeot poderia ter levado quatro multas:

  1. As mulheres não usavam o cinto de segurança (Infração grave, 5 pt + R$ 195,23).
  2. Uma delas estava assentada na tampa traseira: proibido transportar passageiros no lado externo do carro (infração igualmente grave), com inexplicável exceção para políticos desfilando na caçamba de picape em época de campanha eleitoral.
  3. Infração cometida pelo “Wil”  (motorista do Peugeot) permitindo embarque e desembarque de passageiro com o carro parado no meio da rua (média, 4pt + R$ 130,16).
  4. Esta foi cometida mas não poderá ser punida: o Wil insinuou ter ingerido bebida alcólica antes do “desfile”. Mas, sem comprovação naquele instante, a multa não poderia ser aplicada.

Biquíni pode? Sim, pois a legislação de trânsito (Código de Trânsito Brasileiro) é omissa quanto à indumentária de motorista e passageiros. Só proíbe sandália de dedo pois o calçado do motorista deve estar preso ao pé. Nem permite salto alto pois dificulta a operação dos pedais.

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Descalça poderia? Sim: como não proíbe, então pode. E nua? Nenhum problema com o código de trânsito, mas configura atentado ao pudor.

Sonzão pode? Depende do volume: se exceder os decibéis permitidos, é infração! Então o motorista poderia substituir os exagerados alto-falantes por discretos fones de ouvido? Também não: infração média com 4 pontos no prontuário e menos R$ 130,16 no saldo bancário.

Cadeirinhas

Surrealismos e trapalhadas não faltam no nosso código de trânsito. Infração pelo uso da cadeirinha infantil no automóvel está sendo discutida em Brasília. Mas, mesmo tendo reduzido substancialmente os ferimentos e mortes de crianças em acidentes de trânsito desde sua obrigatoriedade em 2014, elas ainda não foram regulamentadas nos táxis, ônibus e nem nas… acreditem: vans escolares.


Extintor

Depois de exigidos durante anos, tornaram-se praticamente inúteis com o advento da injeção eletrônica. Sem carburadores e distribuidores, carro se incendiar tornou-se bastante improvável.

Além do mais, motoristas sequer tinham ideia de onde estavam, no carro. Podiam até encontrá-lo, mas não sabiam manejá-lo. E, quando sabiam, de quase nada valiam para apagar o fogo.

Finalmente eliminados há cinco anos, o lobby de seus fabricantes voltou à carga. Pressionam o Contran, o Corpo de Bombeiros, médicos especializados em trânsito, acionam sua metralhadora giratória ($$$) para que retorne sua obrigatoriedade. Afinal, são bilhões de reais em jogo.


Mas nem o extintor escapou do surrealismo: ele só é obrigatório hoje em veículos comerciais. Mas caso ele esteja no automóvel sem cumprir as exigências técnicas, o motorista só evita a infração numa blitz desfazendo-se dele.

Rodízio

Nem vale mais a pena contestar essa ideia do rodízio adotada em São Paulo. Mas, como ela desafortunadamente existe, a legislação é muito clara e objetiva: só se pode punir por desrespeito ao rodízio em vias devidamente sinalizadas e definindo claramente os limites em que os veículos não podem circular. Alguém já observou essas indicações em São Paulo?

Carro autônomo?

Pela legislação vigente, quem comete infração não é o motorista, mas o automóvel. Pois se um carro é vendido depois de seu dono ter cometido uma infração, mas a autoridade de trânsito atrasou ao emitir a notificação, cabe ao novo proprietário pagar a multa de responsabilidade do ex-dono. Ou seja, no Brasil a lei se antecipou à era do carro autônomo e considera que ele é responsável pela multa, não o motorista.


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