Blog do Boris

Mentira repetida vira mesmo verdade?

O azar de quem inventou o carro antes de Carl Benz foi não ter uma empresa para perpetuar a mentira; confira outras "inverdades"

Boris Feldman

26 de ago, 2019 · 7 minutos de leitura.

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“Mentira repetida mil vezes vira verdade” é frase de Goebbels, ministro da propaganda de Hitler. Quando o assunto é automóvel, é seguida à risca…

Primeiro carro do mundo

Bom exemplo de mentira que virou verdade é o mito do primeiro automóvel do mundo. Entre vários que se dedicaram ao projeto no final do século XIX um dos mais bem sucedidos foi Carl Benz, que patenteou seu triciclo motorizado em 1886.

Mas pelo menos outros dois puseram veículos com motor a combustão para rodar antes dele: o francês Delamare-Debouteville patenteou seu carro dois anos antes, em 1884, e o judeu-alemão Siegfried Markus também pôs seu carrinho a combustível líquido para rodar anos antes na Áustria.

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Entretanto, como a oficina de Benz deu origem a uma fábrica (Daimler-Benz) que existe até hoje, a empresa insiste em se anunciar a inventora do automóvel. Os outros não tiveram mesma sorte e ninguém para contestar.

‘Passageiros ilesos? Milagre!’

A imprensa vive se referindo ao “verdadeiro milagre” do carro que capotou, saiu da estrada, bateu no barranco mas motorista e passageiros saíram ilesos.

Nem passa pela cabeça do jornalista responsável por esta besteira que o milagre tem “santo”:  dezenas de engenheiros projetando uma carroceria deformável nas extremidades, porém reforçando a estrutura do habitáculo a partir de análises gráficas e simulações computadorizadas para otimizar a proteção aos ocupantes.


Ponteiro travado em batida

Outra menção frequente é ao velocímetro que ficou travado depois do impacto “marcando 190 km/h”, insinuando ser esta a velocidade do carro no momento do acidente. Ora, é óbvio que o ponteiro dificilmente aponta corretamente depois de uma pancada.

Não faltam também os depoimentos de pedestres nas proximidades do local do acidente: “Passou por aqui feito um doido, a quase 200 por hora!”. Uma inacreditável capacidade de estimar a velocidade do veículo…

Quantos cabem?

Vi recentemente notícia de uma station wagon (perua Opala Caravan) envolvida num grave acidente que resultou na morte de duas pessoas, quatro feridas e outras duas ilesas. Nenhum policial, socorrista ou sequer o jornalista fez as contas: afinal, o que esperar de um automóvel (bem velhinho…) projetado para cinco pessoas que carregava motorista mais sete passageiros? Freios e suspensão (mesmo imaginando-se em perfeitas condições) tinham condições de suportar tanto peso? Outro dia, a imprensa noticiou que uma Kombi foi flagrada carregando nada menos que 18 pessoas. Pode?


Esquentar o motor? Amaciar?

Dica que se mantem viva pois repetida por várias gerações é a de “esquentar o motor antes de sair de manhã”. Hoje, mesmo com injeção eletrônica, afogador automático e outras modernidades tecnológicas, ainda tem motorista que segue a recomendação.

Outra que permanece: dono de carro zero km roda bem devagarinho durante os primeiros quatro ou cinco mil quilômetros para “amaciar o motor”.

Hoje, com a evolução da mecânica e eletrônica, basta não pisar fundo no acelerador nos primeiros 500 km, até para que se ajustem também outros componentes como freios e pneus.


Garantia ‘de caixa e motor’

De tanto ver placa anunciando “garantia de três meses para motor e caixa” em lojas de usados, o freguês nem imagina que tem direito a muito mais, pois o código do consumidor estabelece a responsabilidade da empresa para todos os componentes do automóvel.

Picape com multilink

Mentira divulgada pela própria fábrica é difícil contestar. A Nissan “inventou” que a nova picape Frontier tem suspensão traseira do tipo multilink e a inverdade vai virando verdade. Quase nenhum jornalista teve a curiosidade de se abaixar atrás dela  para ver um baita eixo rígido ligando as rodas traseiras…

Fantasia

As pistas de corridas também se notabilizam por divulgar inverdades, o "vale-tudo" do marketing. No Brasil, carros da Stock Car e do Brasileiro de Marcas contam com exatamente a mesma sofisticadíssima mecânica, sem sequer um parafuso do modelo original.


Podem se fantasiar de marcas diferentes ou numa única (carro da Stock hoje faz de conta ser um Cruze). Exatamente por ser uma grande mentira para os espectadores, são provas danadas de emocionantes.

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