Uma ação civil pública “sem pé nem cabeça” foi desfechada na semana passada pelo Ministério Público Federal contra a GM, exigindo recall de mais de um milhão de unidades do Chevrolet Onix e cobrando multa de bilhões de reais (5% do lucro auferido com a venda destes carros). Incluiu na ação a União Federal e o Denatran, por omissão. Mas a GM está correta de acordo com a legislação brasileira.
Testes ‘sobem a régua’
Uma entidade uruguaia independente, o LatinNCAP, realiza crash-tests (testes de impacto) em automóveis comercializados na América do Sul e Caribe para avaliar seu nível de proteção aos ocupantes. E os classifica de zero a cinco estrelas conforme os resultados dos crash-tests com dummies (bonecos). Nenhuma dúvida da importância do LatinNCAP para “subir a régua” da segurança de nossos automóveis. Porém…
LatinNCAP muda as regras
O Chevrolet Onix, lançado e submetido aos primeiros testes em 2012, foi aprovado com três (das cinco possíveis) estrelas. Mas, testado em 2017, foi reprovado: nenhuma estrela. Mudou o carro? Não: o LatinNCAP mudou seus protocolos, tornando-os mais rigorosos e incluindo teste de impacto lateral.
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A GM reforçou então a estrutura do Onix, que foi novamente testado em 2018 e recuperou as 3 estrelas. Não somente por uma preocupação com a reação (ou integridade) do consumidor, mas até porque, como observa Cassio Pagliarini (da Bright Consultant), várias empresas não compram carros “inseguros” (classificados com menos de três estrelas) para suas frotas.
Leis obsoletas
A GM diz que o Onix foi projetado respeitando as leis brasileiras. Que são, em geral obsoletas, resultando portanto, na insegurança dos nossos veículos em relação aos de outros países. À época em que foi lançado no mercado, não havia exigência do governo de resistência a impactos laterais.
Apesar disso, o MPF decidiu acionar a GM baseado nos resultados dos testes do LatinNCAP, que jamais foi homologado ou certificado pelo governo brasileiro para avaliar nossos carros. A entidade uruguaia estabelece seus próprios critérios, sem levar em consideração as características de cada legislação. Mas o MPF alega também que o Ônix não cumpria, entre 2012 e 2017, a ”regulação de proteção contra impacto lateral básica das Nações Unidas [UN95]”. Pergunta-se: qual dos nossos carros observava a regulação da ONU?
Mais perigoso?
Parece que o MPF ignora a constante evolução dos automóveis sob todos os aspectos, inclusive os de segurança. Neste caso, ele deveria acionar todas as fábricas brasileiras que respeitam nossa legislação, porém com modelos mal avaliados pelo LatinNCAP, como o Nissan March, Fiat Mobi, Peugeot 208, Renault Logan e outros.
O MPF não explicou porque virou sua artilharia contra o Onix. Justifica seu comportamento alegando que, os produzidos entre 2012 e 2017, não oferecem proteção aos ocupantes no caso de impacto lateral. Entretanto, correm mesmo risco os ocupantes de outras dezenas de milhões de carros circulando no Brasil.
Ou as estatísticas de acidentes por acaso apontaram o carro da GM como veículo mais perigoso que os demais?
Medo de represália?
O LatinNCAP testou e reprovou a picape Ford Ranger vendida na Colômbia sem airbags. E publicou aqui o resultado com um pequeno asterisco (explicando a diferença de legislação), para “amenizar” a aberração, uma entre as diversas que prejudicam nossa indústria.
Mas nossas fábricas se silenciam diante dos deslizes dos uruguaios, pois temem represálias: existem critérios subjetivos ao atribuir pontos negativos aos carros testados, avaliados pelos técnicos do LatinNCAP.
Lei obsoleta, recall inexequível
Carros comercializados no Brasil devem ser aprovados pelo governo em testes homologatórios. Esta é a exigência legal. Ponto. Então, a solução não é o MPF multar a fábrica, mas evoluir a legislação.
Pior ainda é a incompetência técnica do MPF ao exigir um inexequível recall dos Onix produzidos entre 2012 e 2017: não se trata de trocar um parafuso ou um componente, mas substituir a carroceria completa do automóvel, única solução para dotá-lo da mesma estrutura lateral incorporada a partir de 2018.
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