Em maio, o Audi R8 vendeu todas as unidades destinadas ao País em apenas uma semana. No mês seguinte, outra surpresa. Após o lançamento do Volkswagen Nivus, as pré-vendas pelo site esgotaram o lote do SUV-cupê em apenas 7 minutos. Mas por que isso vem acontecendo? Quais os motivos para esses e outros veículos, que sequer tenham sido testados pela clientela, se tornarem tão disruptivos?
Atrás de respostas, fomos atrás de especialistas do setor automotivo para comentar esse fenômeno. Para Fernando Trujillo, consultor da IHS Markit, o Nivus é um caso à parte. Com o mercado de SUVs aquecido, portanto, optar pelo novato gera exclusividade. E brasileiro gosta disso. “Ele (o Nivus) é o primeiro SUV-cupê do Brasil sem ser de marca de luxo. Isso, tornou acessível um tipo de carroceria antes oferecida apenas por fabricantes como BMW e Mercedes-Benz, por exemplo. É tudo questão de criar o desejo no consumidor”.
Ele comenta que o fato de a Volkswagen ser uma marca muito forte no Brasil e, ao mesmo tempo, estar renovando todo o seu portfólio, com mais tecnologia e novo design, também contribui para o sucesso. A marca afirma que o Nivus já ultrapassou as 10 mil unidades vendidas.
Nos EUA
Outra situação inusitada aconteceu nos EUA, em agosto. A Ram 1500 TRX foi lançada sob a alcunha de ser, então, a picape mais rápida do mundo. A potência da grandalhona chega a 711 cv. A edição Launch Edition se esgotou em apenas três horas, com exatos 702 pedidos preenchidos. Além de potência de sobra, a picape se destaca pelo emblema vermelho de alumínio escovado no console, identificando se tratar de uma série limitada.
Antes de mais nada, neste caso, estamos falando de um veículo que ainda levaria meses para ter sua produção iniciada. E, um detalhe: o preço começava em quase US$ 100 mil. O montante, todavia, supera os R$ 570 mil na conversão direta.
Picape elétrica também é modelo disruptivo
Mais curioso ainda é o caso da picape Hummer EV. Depois de dez anos extinta, a Hummer voltou ao mercado na semana passada. Agora, em forma de picape e sob o guarda-chuva da GMC (marca voltada à veículos comerciais da General Motors), fez um sucesso estrondoso. A novata, no entanto, que chega às mãos dos compradores só no fim de 2021, teve toda sua produção esgotada em pré-venda em uma hora.
Aqui, além de também rondar os R$ 100 mil, o modelo tem motorização elétrica. Entretanto, não se trata de qualquer propulsão. Estreando a categoria dos super utilitários com zero emissão, quem faz as honras são os três motores elétricos. Juntos, são capazes de gerar absurdos 1.000 cv. A autonomia é de 560 km e, no mais, vai da inércia aos 100 km/h com tempo digno de superesportivo. São gastos, apenas, 3 segundos para o feito.
“Estes modelos são bem sucedidos por vários motivos, mas eu destacaria, em alguns casos, o poder da marca. Isso remete a uma diferenciada percepção de desempenho e qualidade”, enfatiza a especialista no setor automotivo, Leticia Costa, sócia da Prada Assessoria.
Ela afirma que o efeito “novidade”, contudo, desperta atração no consumidor, potencialmente, por serem mais exclusivos. Outro fator é o design. “Ninguém compra um carro que ache feio. As linhas podem ser atraentes por ter apelo retrô, por ter personalidade ou, apenas, por serem modernas”, aponta.
“O conteúdo básico do modelo também pode ser parte do atrativo”, afirma Letícia. Para ela, essa afinidade com determinado veículo é aprofundada quando o cliente avalia a concorrência direta. Ou seja, no caso da Hummer EV, além do apelo da sustentabilidade, de quebra, é uma picape extremamente potente. Um diferencial e tanto para quem busca exclusividade no segmento.
Em 4 minutos
Quem também registrou rapidez de vendas de cair o queixo foi o Civic Type R Limited Edition. Após o lançamento, a Honda conseguiu esgotar todas as 100 unidades destinadas ao mercado canadense em 4 minutos. Isso porque, para garantir a compra, os interessados precisaram depositar a quantia de US$ 1.000. Seria o equivalente a mais de R$ 4.337 na cotação de hoje.
O Jornal do Carro está no Youtube
Inscreva-seÀ época, Andrew Tai, CEO e cofundador do Motoinsight, que controla as vendas online do modelo ficou impressionado com o sucesso. Ele disse, contudo, que os consumidores estavam comprando um carro que nem ao menos tinham visto de perto. Para os especialistas, o “quê” de exclusividade de uma nova geração somado à tecnologia embarcada nada mais é que, enfim, uma receita para conquistar o cliente.
“É o mesmo que juntar a fome com a vontade de comer”, aponta o consultor Paulo Garbossa, da ADK Automotive. Ele pondera que o público tem um xodó por determinados modelos, e isso reverte em sucesso de vendas. “Na década de 1980, por exemplo, os americanos ficaram órfãos do Bronco. Quando viram que a Ford estava trazendo o carro de volta, com as devidas atualizações, o público logo se interessou”, exemplifica.
Tradição
De fato, este é o caso mais recente de modelos disruptivos. O Ford Bronco, que foi lançado no mercado com apelo retrô e, além disso, três opções de carroceria para ampliar o leque de adversários, já é sucesso. Mesmo sem abrir vendas, o novato caiu nas graças do público e já ultrapassou as 190 mil reservas nos Estados Unidos. As entregas estão previstas para meados de 2021.
O modelo inédito também sequer passou pelas mãos dos jornalistas automotivos. Ou seja, ninguém conhece o comportamento do SUV, nem mesmo por meio de leituras ou vídeos. O cliente cada vez mais vem dando tiros no escuro. Precipitação? Desejo de exclusividade? Loucura? O fato é que as práticas do consumidor, de fato, são outras.
Pandemia = mais tempo para pesquisar
Para Garbossa, a princípio, a pandemia contribuiu para essa mudança de comportamento. “Nesses meses de quarentena, o Brasil ganhou cinco anos em tecnologia. As pessoas estão mais virtuais que nunca. Hoje, o papo na hora do café foi substituído. Agora, esses minutos são reservados à pesquisas de produtos, inclusive, carros”, pontua.
Mas cabe um parênteses. Para Trujillo, esses veículos “fora da caixinha” são, em primeiro lugar, um nicho de mercado. O executivo afirma que essas pré-vendas não refletem o ciclo de vida do modelo. “O nome forte, a vasta tecnologia e o design agressivo criam essa repercussão inicial e o desejo no consumidor, impactando no marketing e, dessa forma, facilita as vendas. Porém, elas (as vendas) não são sustentáveis”, pondera.