As vendas de carros híbridos e elétricos, bem como a oferta de novos modelos, não param de crescer no Brasil. No primeiro semestre de 2022, foram emplacadas 20.427 unidades. Para comparação, no mesmo período as vendas de automóveis com motor a combustão passaram de 83 mil. Embora os números absolutos sejam pequenos, houve alta de 47% em relação às vendas do mesmo período de 2021. Vale lembrar que os dados incluem carros elétricos a bateria e híbridos, sejam convencionais, leves ou plug-in.
Há quem diga que uma solução é carregar o carro em casa, como se faz com os telefones celulares. Mas é importante frisar que nem todo mundo tem tomada específica, aterrada e com três pinos, na garagem. Ou seja, além do custo do carro, há ainda a necessidade de se investir em infraestrutura residencial. De acordo com especialistas, por ora, não dá para abrir mão da combustão.
Por isso, o carro híbrido é, de longe, o melhor caminho para pavimentar essa transição de matriz energética nos veículos. E é de olho nessa realidade que algumas montadoras têm seguido por esse caminho. A Toyota, por exemplo, já aposta na tecnologia híbrida há mais de duas décadas.
Híbrido flex
Apostando suas fichas na solução híbrida flex, a Toyota (que quer ter todos os seus modelos eletrificados até 2025) acredita que, além da comodidade, isso vai ao encontro da realidade brasileira, que tem larga produção local do etanol. O biocombustível, inclusive, ajuda na redução de emissões de gases poluentes. Afinal, tem ciclo mais limpo – a própria cana-de-açúcar absorve o gás carbônico.
E experiência no assunto a Toyota tem de sobra. Para quem não se lembra, a marca japonesa foi a primeira do mundo a produzir um veículo híbrido. Nascido na década de 1990, o Prius é o precursor de modelos de sucesso no mercado nacional, como Corolla (2019) e Corolla Cross (2021).
Todavia, a combinação entre etanol e eletricidade não se trata da única solução encontrada pela Toyota rumo à sustentabilidade. A fabricante tem outros três modelos disponíveis mundialmente: híbrido plug-in, elétrico e célula de hidrogênio. Há dois meses, o Jornal do Carro esteve na fábrica da Toyota em Sorocaba (SP) para conhecer de perto tais tecnologias e, inclusive, experimentou, na prática, a gama de modelos.
Desafios
A interpretação da Toyota, de que o brasileiro ainda não se interessa em pagar tão caro por um produto que exija carregamento em tomada é bastante justa – e real. Afinal, a marca crê que a única possibilidade para o Brasil, no futuro próximo, é o híbrido plug-in. Durante o evento na fábrica do interior paulista, o CEO da marca para a América Latina, Masahiro Inoue, disse que “o brasileiro ainda tem o pé atrás com carros movidos a baterias”. Na visão dele, ao contrário de países desenvolvidos, o consumidor local ainda levanta diversas questões, como a demora na recarga (quando comparado ao abastecimento em postos de combustíveis) e o descarte da bateria”, por exemplo.
Entretanto, se por um lado a Toyota não acredita na disseminação do carro elétrico em um primeiro momento no mercado brasileiro, outras marcas vêm trabalhando nisso. A GM, por exemplo, lançou o Bolt reestilizado há pouco tempo e promete que trata-se da porta de entrada para o futuro da marca.
Em síntese, a GM quer pular o híbrido, e migrar diretamente para os modelos movidos a bateria sob o compromisso de liderar a eletrificação da mobilidade na América do Sul. “Estamos avançando globalmente neste sentido. Parte importante deste processo é tornar cada vez mais sustentáveis nossos veículos a combustão até a migração total do mercado para os carros 100% elétricos, os únicos que não emitem qualquer gás poluente”, diz Rodrigo Fioco, diretor de marketing de produto da GM América do Sul.
Mais cartas na manga
Com a visão de que “a faixa dos automóveis premium será a primeira que os EVs vão dominar”, a marca quer ofertar a mais completa linha de veículos zero emissão. De acordo com a GM, entre as próximas estreias estão o Bolt EUV, o Blazer EV e o Equinox EV. E há ainda outros modelos em fase de estudo de mercado para os próximos anos.
Com sua visão de um futuro com “Zero acidente, zero emissão e zero congestionamento”, a GM tem o compromisso de se tornar neutra em carbono até 2040. Como parte deste plano global, a empresa está investindo US$ 35 bilhões (pouco mais de R$ 184 bi, na conversão direta) no desenvolvimento de 30 veículos elétricos e autônomos até 2025.
Elétricos em alta
De acordo com a mais recente edição do anuário Global Electric Vehicle Outlook da IEA, a venda total de veículos 100% elétricos bateu recorde em 2021. Somou 4,9 milhões de unidades. Mais que o dobro do ano anterior. Há um estudo do BCG, divulgado pela Anfavea, que prevê que dois terços dos veículos vendidos no Brasil serão eletrificados até 2035. Para isso, as empresas locais devem seguir as tendências globais.
“Políticas voltadas à redução de emissões, maior conhecimento dos benefícios dos carros zero emissão e o aumento no preço dos combustíveis são fatores que contribuem para o maior interesse global pelos EVs, assim como a maior oferta de modelos e a redução da diferença de preço em relação aos demais tipos de automóveis”, explica Marcos Paiva, diretor de estratégia de EVs da GM América do Sul.
Na GM, novas plataformas…
Para tornar os veículos elétricos mais acessíveis, eficientes e ofertados em larga escala, a GM trabalha em soluções estratégicas, como as tecnologias Ultium e Ultifi. A primeira, trata-se, a princípio, de uma plataforma modular específica para carros elétricos. Nela, há diferentes combinações de motores e baterias, com composição química muito mais evoluída. Com ela, é possível fazer desde carros compactos, passando por SUVs, superesportivos e até picapes.
Contudo, a Ultifi, trata-se de uma arquitetura eletrônica que permite novos aplicativos, serviços remotos inéditos e personalizações até então inimagináveis na experiência a bordo. As tecnologias Ultium e Ultifi já estarão presentes nesta nova geração de veículos elétricos da empresa.
… e até financiamento exclusivo
E a crença nesse segmento é tão grande por parte da GM que já tem até planos de vendas diferenciados para carros elétricos. Mais precisamente, a Chevrolet Serviços Financeiros criou um plano de financiamento exclusivo, sem parcelas mensais, para o Bolt EV.
Trata-se, a princípio, do Plano Zero + Chevrolet. Para adquiri-lo, o cliente precisa dar entrada a partir de 50% do valor do veículo e o saldo remanescente em duas vezes. Fica assim: 25% no 12º mês, e os 25% restantes ao final do contrato, no 24º mês.
“Criamos um plano especial de financiamento para o lançamento do Bolt EV. É uma proposta flexível, com configuração diferente, ainda não disponível no mercado”, enfatiza Paulo Noman, presidente da Chevrolet Serviços Financeiros. Para quem preferir, há outras modalidades mais convencionais, como entrada de 35% e valor restante dividido em até 36 vezes, por exemplo.
Caoa Chery, Stelllantis, VW e Volvo
Umas preferem híbridos, outras elétricos, mas isso não é via de regra. Afinal, enquanto o mercado ainda não sabe qual deve ser o modelo hegemônico no futuro, tem até fabricante apostando em duas soluções ao mesmo tempo. Caoa Chery e Volvo, por exemplo, já vendem modelos híbridos e também elétricos, atraindo público para todos os bolsos e gostos. Inclusive, é da chinesa que vem o elétrico mais barato do Brasil, o compacto iCar – R$ 149.990.
A Volvo, entretanto, foi a primeira fabricante a eletrificar toda a sua frota no Brasil. “Esse é um movimento que iniciamos (no País) há mais de um ano e tem se expandido por toda a América Latina”, destaca Luis Rezende, presidente da Volvo Car Brasil e head of Latin America Hub.
Com portfólio composto pelos elétricos XC40 e C40, bem como pelos híbridos XC60 e XC90, a Volvo promete novidades. “A chegada de novos modelos vai impulsionar ainda mais nossas metas de eletrificação”, completa Rezende. Ele, a princípio, se refere aos veículos zero emissões XC40 Plus e EX90.
Stelantis vem com tudo
A Stellantis projeta que, em 2030, todos os carros de suas marcas vendidos na Europa serão elétricos. O índice, portanto, será de 50% nos Estados Unidos e cai para 20% no Brasil.
“Nossas cinco marcas presentes no Brasil (Fiat, Jeep, Peugeot, Citroën e Ram) têm cada qual uma forte identidade e intensa conexão com seu público. Vamos destacar e aprofundar estas características a cada produto lançado”, explica o presidente da Stellantis América do Sul, Antonio Filosa.
De acordo com Filosa, “a indústria automobilística atravessa, no Brasil e no mundo, o mais rico período de transformação de sua história. Tudo está em evolução. E este é um processo com suas várias etapas. Algumas tendências já estão claramente desenhadas. O futuro será da eletrificação, da direção assistida e autônoma, da conectividade, da descarbonização”, pondera.
Para ele, a ideia consiste em, de imediato, evoluir para uma matriz múltipla de propulsão. Nela, a princípio, conviverão motores a combustão menores e mais eficientes, motores a etanol, motores elétricos e sistemas híbridos. “A tendência é a eletrificação, mas devido ao custo elevado das soluções, ela não evoluirá de modo igual em todo o mundo.”
Etanol + elétrico
Como bem lembrou Filosa, o Brasil tem uma alternativa energética sustentável, o etanol. “Quando considerado do campo à roda, este combustível atende às mais rigorosas normas de emissões. Por isso, pode e deve ser considerado”.
“Estamos trabalhando no plano de longo prazo em produtos e tecnologias e apostamos nas possibilidades da combinação de etanol e eletrificação. Isso cria uma tecnologia amigável do ponto de vista ambiental. Além disso, é mais acessível a faixas maiores do mercado consumidor. Essa é a direção que a Stellantis planeja seguir no Brasil”, afirma Filosa. Até o momento, o grupo já lançou no Brasil os elétricos Fiat 500e e Peugeot e-208 GT. No ramo dos híbridos, entretanto, a Jeep trouxe o Compass 4xe (que é plug-in).
A Volkswagen também tem planos de seguir essa linha. Entretanto, até agora, nada de híbrido flex tampouco de carro elétrico à venda nas concessionárias da marca no Brasil. Questionada em relação a planos futuros e sobre quando pretende excluir os carros 100% a combustão de seu portfólio no Brasil, a fabricante preferiu não se manifestar.