É fato que a indústria automotiva global caminha para uma ampla eletrificação dos veículos, com China e Europa como prioridade nas entregas e prazos. No Brasil, os planos ainda são tímidos, mas o Grupo Stellantis acaba de anunciar estratégia para usar modelos híbridos a etanol até 2030, que pode acelerar toda a cadeia local.
Para isso, a Stellantis vai investir 30 bilhões de euros até 2025 em eletrificação e desenvolvimento de softwares e soluções. O valor é equivalente a R$ 167,5 bilhões na conversão direta. Entretanto, incluí todos os mercados no mundo e não apenas o Brasil. Assim, mostra o custo da corrida pela eletrificação dos carros em nível global nas montadoras.
De acordo com Antonio Filosa, presidente da Stellantis na América do Sul, meta de eletrificação para o País será de 20% da linha de produtos até 2030. Em outras palavras, a montadora que reúne Citroën, Fiat, Jeep, Peugeot, RAM, entre outras marcas, prevê que 1/5 das vendas serão de carros com algum tipo de eletrificação. A meta é zerar as emissões até 2050.
Quando a Stellantis vai lançar o primeiro carro híbrido nacional?
Ainda não houve um anúncio específico de novos modelos nacionais das marcas da Stellantis. Mas a montadora garantiu que haverá foco no lançamento de um novo conjunto mecânico eletrificado com base na plataforma GSE, que é global e “nasceu preparada para a hibridação”, de acordo com os executivos da empresa.
Assim, os novos modelos serão Mild Hybrid (MHEV), ou seja, híbridos leves com sistema de 48V combinado ao motor a combustão. Haverá também o Full Hybrid (HEV), como no Toyota Corolla sedã, que une bateria e motores elétrico e a combustão. Bem como o sistema Plug-In Hybrid (PHEV), que será o principal foco da Stellantis. Por fim, a montadora vê os veículos elétricos a bateria (BEV) com menor volume e foco no segmento premium.
Em todos os cenários, a base é o uso do etanol como fonte de energia. Ou seja, o motor a combustão será a etanol (o que pode dispensar o sistema flex no futuro), ao passo que existe também um plano de produzir células de combustível a etanol para abastecer os carros elétricos a hidrogênio. Esse, porém, é um cenário bem mais futurista.
Rota de eletrificação
A Stellantis planeja eletrificar até 50% dos produtos à venda nos Estados Unidos, por exemplo, dentro do mesmo prazo que projeta ter 20% de eletrificação no Brasil. Entretanto, o diferencial do plano da empresa está na grande localização de tecnologias. Ou seja, cada mercado vai poder aplicar soluções e tecnologias locais, que são mais baratas que soluções importadas, para alcançar a meta de eletrificação e de corte nas emissões de carbono.
Assim, o Brasil, que é o maior mercado da América do Sul, vai desenvolver o “Projeto Bio-Electro” com veículos híbridos que usam bateria aliada ao motor a combustão alimentado com etanol. Sim, é uma dispensa do atual motor flex. “Acreditarmos que a melhor solução para o Brasil é o uso do etanol, que já está consolidado no País. Assim, para nós (Stellantis), será crucial associar o etanol com a eletrificação”, sintetiza o CEO da Stellantis, Antonio Filosa.
Segundo o executivo, o plano da Stellantis é totalmente viável, uma vez que a empresa já tem a maior oferta de modelos elétricos no País atualmente. São sete veículos a baterias: Fiat 500e, Peugeot e-208 GT, Peugeot e-2008, Jeep Compass 4xe, Fiat e-Scudo, Citroën E-Jumpy e Peugeot e-Expert. Portanto, a montadora quer ampliar essa oferta nos próximos anos, mas com um custo menor e a produção local de novas tecnologias.
Como é o plano de eletrificação da Stellantis
De acordo com Filosa, a ideia central do plano Bio-Electro está na descentralização da cadeia produtiva. Isso significa deixar de depender de tecnologia europeia, bem como ampliar a cadeia produtiva no Brasil e na Argentina. Atualmente, a Stellantis tem fábricas em Betim, Minas Gerais (Fiat); Goiana, Pernambuco (Fiat/Jeep); e Porto Real, Rio de Janeiro (PSA). Há também unidades da Fiat e PSA na Argentina, que segundo Filosa, serão ampliadas e modernizadas.
Mas a principal ideia é ampliar o parque produtivo no Brasil, não necessariamente com novas fábricas completas, mas com cadeias de produção de componentes em diferentes praças. “Descentralização é bom para Stellantis porque se concentramos o PIB em poucas regiões, não temos uma ampliação de consumo. Ao passo em que é comprovado que, onde levamos nossas fábricas, ampliamos as condições não só econômicas, mas sociais. É um cálculo econômico muito forte”, explica Filosa.
Pelas contas da empresa, o total de profissionais de criação de produtos engloba 1.500 engenheiros e 300 designers automotivos entre Betim, Goiana e Argentina. Para o presidente da Stellantis, esse potencial humano será usado para “localizar qualquer tecnologia que o mercado nos chame a desenvolver”.
Como foi a definição do plano
Segundo a Stellantis, testes dinâmicos com veículo abastecido por quatro fontes diferentes de energia demonstraram que a matriz brasileira de biocombustíveis é a mais sustentável dentre as alternativas globais. Neste teste, com metodologia da Bosch, um veículo rodou 240,49 km sob as mesmas condições com quatro tipos de combustível.
Assim, de acordo com a empresa, com a gasolina tipo C (E27, usada no Brasil, com mistura de até 27% de etanol), o nível de emissões foi de 60,64 kg de CO2eq. Já o sistema 100% elétrico com energia da Europa gerou 30,41 kg de CO2eq. Por sua vez, com sistema movido 100% a etanol (E100), as emissões ficaram em 25,79 kg de CO2eq. Por fim, sistema 100% elétrico com o combustível vegetal feito da cana-de-açúcar rendeu 21,45% kg de CO2eq. Assim, o etanol apresenta redução de mais de 60% de emissão de poluentes na comparação com gasolina.
O sufixo “eq” junto ao índice de CO2 indica o cálculo total, desde a origem do combustível e não apenas na medição feita no escape do automóvel. Ou seja, é o processo chamado “do poço à roda”. Segundo Antonio Filosa, 30% do parque automotivo nacional roda com etanol diariamente. Ou seja, há um potencial de ampliação gigante.
Carro híbrido virá mesmo sem ajuda do governo
Segundo o chefe da Stellantis, a montadora vai executar o plano mesmo sem uma definição de metas e incentivos do governo brasileiro. É um cenário diferente do que acontece em diversos países Europeus, nos Estados Unidos, na China e na Índia, onde as metas de descarbonização são publicas e cada vez mais rígidas. Entretanto, o mercado brasileiro representa um volume expressivo para a empresa. E investir aqui será decisivo diante da concorrência.
“Ter uma escala garantida com nossa atual participação de mercado permite discutir e viabilizar investimentos com acionistas. E convencê-los de que vale investir no Brasil, porque temos força para garantir isso no período de 20 a 30 anos”, afirma Filosa.
Ainda segundo o presidente da montadora, essa rota definida para o Brasil é a mais rápida e barata, por causa do amplo desenvolvimento local do etanol como combustível, já considerando o chamado “etanol 2.0”, que tem menos água em sua formulação e é mais energético. Além disso, há o ganho em escala, uma vez que, com o parque de fornecedores locais, os custos são menores e os lucros maiores, o que vai pavimentar essa transição para os híbridos no País.
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