Blog do Boris

Tributo ao Peres

Alfredo Peres da Silva foi exceção à regra: um presidente do (Conselho Nacional de Trânsito) Contran competente e preocupado com a segurança veicular

Boris Feldman

21 de jan, 2019 · 7 minutos de leitura.

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Crédito: Alfredo Peres da Silva foi presidente do Contran e diretor do Denatran (Foto Arquivo ABTC)

A sucessão de diretores incompetentes à frente do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) teve pelo menos uma exceção: Alfredo Peres da Silva, que dirigiu a entidade máxima do trânsito brasileiro de 2005 a 2010 e que faleceu no domingo, dia 13 de janeiro. Nasceu em Corumbá (MS), formou-se em direito e foi um dos maiores especialistas em trânsito no Brasil.

Participou ativamente da elaboração do Código de Trânsito Brasileiro, publicado em 1997 e vigente desde janeiro de 1998. Defendia com unhas e dentes a segurança veicular e a educação de trânsito nas escolas. Foi também diretor de inúmeras entidades de transporte de cargas e recebeu várias condecorações em reconhecimento ao seu trabalho no setor.

Como jornalista, eu sempre critiquei a postura do governo federal em relação ao trânsito, à segurança veicular e à legislação. O Peres foi, até hoje, o único a me ligar e retrucar. Trocávamos ideias. E farpas, algumas vezes. Defendia com elegância certas decisões que eu criticava com certa dureza. “No governo – ele dizia – não se faz exatamente o que se quer, mas o que é possível”.

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Um belo dia, recebo uma ligação de sua secretária pedindo uma reserva de data. Dias depois era o Peres na linha, oficializando um convite para uma palestra em Brasília, durante a posse dos novos membros das seis Câmaras Temáticas do Conselho Nacional de Transito.

Especialistas que discutiam e analisavam todas as resoluções técnicas do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que, no frigir dos ovos, determinavam as diretrizes básicas do trânsito a serem executadas pelo Denatran e Detrans de cada Estado.

“Você enlouqueceu Peres? Você me conhece e sabe das minhas críticas a estas câmaras temáticas. Que parte dos nossos problemas de trânsito resultam exatamente de suas decisões atabalhoadas!”


“É por isso mesmo que estou te convidando – retrucou o Peres – Venha e fale o que você quiser”. Fui. Auditório lotado com centenas de empresários, representantes de entidades de classe, de fábricas de automóveis e equipamentos, lobistas, técnicos de ministérios e funcionários de órgãos de trânsito de todo o país.

Pressões políticas e econômicas

Já comecei a palestra afirmando que a responsabilidade de grande parte de feridos e dos 40 mil mortos nos acidentes de trânsito era a incompetência das câmaras temáticas. Fez-se um silêncio ensurdecedor na platéia. Engrenei uma segunda e disse que as câmaras não suportavam as pressões políticas e econômicas do governo, de parlamentares e de empresas do setor. Que muitas de suas decisões significavam faturamento de bilhões de reais ao tornar obrigatório o uso de equipamentos ou a prestação de serviços para dezenas de milhões de veículos e motoristas.

Dei exemplos: a Philips, gigante multinacional, queria ver aprovada a utilização das lâmpadas de xenônio em qualquer veículo. Pressionou as câmaras temáticas com argumentos técnicos distorcidos e interpretando a lei de acordo com sua conveniência. Apesar dos pareceres de que, tecnicamente, se instaladas em automóveis não projetados para seu uso, iriam ofuscar outros motoristas e provocar acidentes.


Citei outros absurdos decididos pelas câmaras como a exceção à obrigatoriedade de se carregar crianças no banco traseiro em picapes ou esportivos que só contavam com o dianteiro. As fábricas de automóveis pressionaram também durante muito anos para que o Contran não exigisse o apoio de cabeça e cinto retrátil no centro do banco traseiro. Um custo adicional para a fábrica, apesar de ser óbvio que o quinto passageiro tivesse direito à mesma proteção que os outros quatro.

Critiquei a permissão do transporte – assassino – de boias-frias nas carrocerias de caminhões. E que a posse de novos membros poderia significar um divisor de águas no nosso triste recorde mundial de mortos no trânsito.

Ao final, os aplausos foram muito pouco entusiásticos. Em compensação, recebi um forte abraço do Alfredo Peres e nossa amizade fortalecida desde então. O Contran nunca mais foi o mesmo depois dele.


O Brasil precisa de mais gente como o Peres…

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Oficina Mobilidade

Testes de colisão validam a segurança de um carro; entenda como são feitos

Saiba quais são os critérios utilizados para considerar um automóvel totalmente seguro ou não

03 de mai, 2024 · 2 minutos de leitura.

Na hora de comprar um carro zero-quilômetro, muitos itens são levados em conta pelo consumidor: preço, complexidade de equipamentos, consumo, potência e conforto. Mas o ponto mais importante que deve ser considerado é a segurança. E só há uma maneira de verificar isso: os testes de colisão.

A principal organização que realiza esse tipo de avaliação com os automóveis vendidos na América Latina é a Latin NCAP, que executa batidas frontal, lateral e lateral em poste, assim como impactos traseiro e no pescoço dos ocupantes. Há também a preocupação com os pedestres e usuários vulneráveis às vias, ou seja, pedestres, motociclistas e ciclistas.

“Os testes de colisão são absolutamente relevantes, porque muitas vezes são a única forma de comprovar se o veículo tem alguma falha e se os sistemas de segurança instalados são efetivos para oferecer boa proteção”, afirma Alejandro Furas, secretário-geral da Latin NCAP.

As fabricantes também costumam fazer testes internos para homologar um carro, mas com métodos que divergem do que pensa a organização. Furas destaca as provas virtuais apresentadas por algumas marcas.

“Sabemos que as montadoras têm muita simulação digital, e isso é bom para desenvolver um carro, mas o teste de colisão não somente avalia o desenho do veículo, como também a produção. Muitas vezes o carro possui bom design e boa engenharia, mas no processo de produção ele passa por mudanças que não coincidem com o desenho original”, explica. 

Além das batidas, há os testes de dispositivos de segurança ativa: controle eletrônico de estabilidade, frenagem autônoma de emergência, limitador de velocidade, detecção de pontos cegos e assistência de faixas. 

O resultado final é avaliado pelos especialistas que realizaram os testes. A nota é dada em estrelas, que vão de zero a cinco. Recentemente, por exemplo, o Citroën C3 obteve nota zero, enquanto o Volkswagen T-Cross ficou com a classificação máxima de cinco estrelas.

O que o carro precisa ter para ser seguro?

Segundo a Latin NCAP, para receber cinco estrelas, o veículo deve ter cinto de segurança de três pontos e apoio de cabeça em todos os assentos e, no mínimo, dois airbags frontais, dois laterais ao corpo e dois laterais de cabeça e de proteção para o pedestre. 

“O carro também precisa ter controle eletrônico de estabilidade, ancoragens para cadeirinhas de crianças, limitador de velocidade, detecção de ponto cego e frenagem autônoma de emergência em todas as suas modalidades”, revela Furas.

Os testes na América Latina são feitos à custa da própria Latin NCAP. O dinheiro vem principalmente da Fundação Towards Zero Foundation, da Fundação FIA, da Global NCAP e da Filantropias Bloomberg. Segundo o secretário-geral da entidade, em algumas ocasiões as montadoras cedem o veículo para testes e se encarregam das despesas. Nesses casos, o critério utilizado é o mesmo.

“Na Europa as fabricantes cedem os carros sempre que lançam um veículo”, diz Furas. “Não existe nenhuma lei que as obrigue a isso, mas é como um compromisso, um entendimento do mercado. Gostaríamos de ter esse nível aqui na América Latina, mas infelizmente isso ainda não ocorre.”