O ano de 1973 foi de grandes lançamentos na indústria automotiva brasileira. Nomes como Ford Maverick, Dodge 1800 e Chevrolet Chevette, por exemplo, chegavam ao mercado nacional, prontos para deter a hegemonia do Volkswagen Fusca, que no ano anterior bateu seu recorde de vendas no País. Ainda assim, quem também preparava uma novidade era a própria VW, que anunciava a chegada de um novo hatch: o 1600 Brasilia.
O modelo, em desenvolvimento desde 1970, era a aposta do então chefe da marca, Rudolph Leiding, para substituir o Fusca no Brasil. Desenhado por uma equipe liderada por Márcio Piancastelli, que também desenvolveu o VW SP1/SP2 e posteriormente o Gol, surpreendia pelo uso inteligente do espaço interno, e pela visibilidade, pontos fortes do carro.
O modelo meio hatch meio perua da VW foi lançado em junho de 1973, mas foi flagrado pelo então Jornal da Tarde um mês antes, pelas mãos do então repórter Luís Carlos Secco e do fotógrafo Oswaldo Luís Palermo. O Brasilia usava o mesmo motor 1.600 boxer utilizado no Karmann-Ghia, com 60 cv de potência e carburação simples, e tinha agilidade adequada à época.
Apesar do desempenho modesto, a novidade agradou o público, que pagava até ágio para ter o carro em mãos, comprovando o seu sucesso imediato. Capaz de acomodar até cinco passageiros, tinha opção de levar a bagagem em seu porta-malas dianteiro, ou acima do motor, no bagagito traseiro, fazendo do modelo o preferido entre os viajantes.
VW Brasilia tinha mais espaço e estabilidade que o Fusca
Além disso, graças às novas rodas de aço aro 14, depois emprestadas ao Fusca 1600S “Bizorrão”, tinha uma estabilidade melhor que a do Fusca, apesar dos pneus diagonais. Barra estabilizadora dianteira e estabilizadores traseiros davam conta do recado, somados à plataforma e bitolas traseiras mais largos, por exemplo. Assim, as vendas continuavam subindo, e em 1976 chegava a versão com dupla carburação e mais potência: 65 cv, onde se ganhava em aceleração e consumo.
Em 1977, mudanças como a tampa do porta-luvas e painel com imitação de madeira foram adicionados, bem como um novo padrão no estofamento. Freios com duplo circuito e coluna de direção deformável chegaram ao modelo, que, em 1978, atingiria seu maior número de produção: 157.700 unidades. O VW Brasilia recebeu seu primeiro redesenho no mesmo ano, adotando lanternas caneladas “tipo Mercedes-Benz”, para-choques mais largos e novo volante, mas perdeu os frisos dianteiros.
Versão quatro portas do VW Brasilia nunca decolou no País
Nesse mesmo ano, já como modelo 1979, chegava ao mercado a versão quatro portas, que já era exportada para outros países desde 1974. No entanto, o modelo nunca “decolou” no mercado interno, que tinha pouca atração com automóveis de quatro portas, pois os considerava inseguros para crianças ou apenas “carros de serviço”. Entretanto, o Brasilia teve seu público: maioria entre taxistas e frotistas.
Ainda em 1979, chegava a versão LS, mais luxuosa. Detalhes como rodas e moldura dos faróis na cor grafite, frisos laterais, para-choques com borrachão, interior acarpetado, rádio Bosch de série e dois alto-falantes, vidros verdes, desembaçador traseiro, interior monocromático, entre demais itens. Era a versão mais cara do modelo.
Em 1980, as vendas já começavam a baixar em um ritmo acelerado, e a principal novidade do modelo era seu novo painel de instrumentos, redesenhado. Itens como relógio e vacuômetro agora estavam integrados ao painel, conferindo um visual mais próximo do Passat, por exemplo. Bancos melhores, também inspirados no modelo, estavam presentes, além de contar com uma versão 1300 a álcool, que, no entanto, em função da baixa potência (49 cv), não fez sucesso.
Chegada do VW Gol em 1980 cimentou o fim do Brasilia
Com o lançamento do Gol, em maio de 1980, o fim do Brasilia era iminente. O desenho moderno, mesmo que prejudicado pelo fraco motor 1300 a ar (substituído pelo 1.600 a ar em 1981), caiu no gosto do público, e roubaria vendas do médio da Volkswagen, que saiu de linha em 1982. Com mais de 130 mil unidades exportadas para países como Nigéria, Portugal, Filipinas, Venezuela e outros, além da produção local no México, o Brasilia vendeu mais de 950 mil exemplares no mercado brasileiro, onde tem muita história, além um público fiel.
Por fim, é inegável que o Brasilia (ou “a” Brasilia, como caiu na graça do público) tem seu valor no imaginário do público brasileiro. Seja como o carro do “Sr. Barriga” no seriado mexicano “Chaves”, ou imortalizada em 1995 pela banda Mamonas Assassinas no hit “Pelados em Santos”, o modelo tem história. Além disso, fez carreira nas pistas nas mãos de Ingo Hoffman, que correu pela extinta Divisão 3 e venceu o campeonato paulista de 1974.
Brasilia 1976 conquista lugar especial na vida de entusiasta
Mesmo fora de linha há quase 40 anos, o modelo ainda tem um espaço especial na vida dos jovens entusiastas. É o caso de Enio Júnior, de 23 anos, proprietário de um Brasilia 1976 azul caiçara. Com o modelo há quatro anos, ele conta que o comprou por acaso, mas acabou se apaixonando. “Tive um Fusca 1968 “modelinho”, e um colega ofereceu a Brasilia em troca. Quando andei no carro, pensei: cara, é isso que eu quero. E eu não achava que fosse ser um carro tão bom”, afirmou Enio.
Além disso, o proprietário elogia a dirigibilidade, que, em sua opinião, é muito superior à do Fusca, por exemplo. O modelo, apesar de ter quase cinquenta anos, é seu favorito para longas viagens, e, desde 2019, já rodou mais de 30 mil quilômetros entre idas do Rio de Janeiro, onde mora, até o Paraná. “Fiz a revisão prévia no carro e sugeri ao meu pai que fossemos até São Paulo. Deu tão certo que repeti o trajeto, e lá decidir ir até Curitiba. Nisso, já fui até lá e voltei algumas vezes”, comenta o assistente de câmera.
Com algumas modificações sutis na suspensão e rodas, pneus radiais e volante esportivo, o VW Brasilia mescla o visual VEB (Velha Escola Brasil) com a originalidade, e rebate comentários descrentes da capacidade do modelo de realizar grandes distâncias. “O carro foi fabricado para isso, andar mesmo, e pensar diferente disso é um preconceito bobo. Gosto de ir trabalhar com ele, e planejo ir mais longe, talvez até o Uruguai. Onde esse carro quiser me levar, eu vou”, conclui.
Siga o Jornal do Carro no Instagram!