Primeira Classe

A época em que um BMW esportivo custava R$ 100 mil

Tínhamos uma moeda forte e muitas esperanças, mas o problema do celular ao volante já existia. Só que as relações humanas aconteciam mais no plano real, não no mundo virtual

Rafaela Borges

16 de fev, 2016 · 10 minutos de leitura.

A época em que um BMW esportivo custava R$ 100 mil
Crédito: Tínhamos uma moeda forte e muitas esperanças, mas o problema do celular ao volante já existia. Só que as relações humanas aconteciam mais no plano real, não no mundo virtual

O BMW Z3 de Edu: R$ 100 mil no fim de 1999 (Foto: Reprodução)

 

Um BMW esportivo custava R$ 100 mil. O Z3, sabe? Antecessor do Z4, cujo lançamento mundial ocorreu em 2002. E as pessoas não estavam dispostas a abandonar o celular nem na hora de dirigir. Como hoje. Só que eram ligações, não mensagens de texto ou de voz via WhatsApp. Digitar: só se fosse torpedo SMS, mas ninguém fazia isso enquanto estava guiando.

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(No Instagram: @blogprimeiraclasse)

“Já tem até lei que proíbe isso”, diz Alma, personagem de Marieta Severo, sobre o hábito de falar ao telefone ao volante.

E é um acidente provocado por esse hábito, que virou um problemão nos dias de hoje, o ponto principal do primeiro capítulo de “Laços de Família”, novela que estreou no fim de 1999, mas teve a maior parte de sua trama exibida em 2000. Por estar conversando ao telefone com sua funcionária, enquanto dirigia, Helena (Vera Fischer) acaba batendo seu Ford Explorer no novíssimo BMW Z3 de Edu, um Reinaldo Gianecchini estreante e nada convincente – quem diria que ele se transformaria em um grande ator.


Laços de Família – Capitulo 1, Parte 1 por bruna-garritano

A reexibição de “Laços de Família” estreou nesta segunda-feira (15) no canal a cabo Viva e, como é bom rever essa obra de Manoel Carlos. Maneco, como é chamado carinhosamente o autor, é um romancista de costumes, e já foi mestre em transportar para as telinhas os hábitos da sociedade. Assim, criou, em suas novelas, um ótimo documentário da época em que elas foram exibidas.


Rever “Laços” me remeteu ao passado. Surgiram lembranças de como era a vida naquela época. Eu tinha 18 anos. Caloura na PUC-SP, no curso de jornalismo. Cheia de sonhos, esperanças e muitas ambições.

Parece-me que também cheio de sonhos, esperanças e ambições estava o Brasil, otimista com a estabilidade econômica conquistada após períodos sombrios consecutivos: ditadura militar, catástrofes econômicas, governos corruptos. Tínhamos uma moeda forte, chances para as iniciativas individuais e muitas grandes empresas chegando ao Brasil.

Nesses 16 anos, ganhamos muito. Muitas facilidades. Mas perdemos tanto. O principal? As relações humanas existiam no plano real. Hoje, estão cada vez mais no mundo virtual.


Listei alguns aspectos que me chamaram a atenção no primeiro capítulo da novela, e que mostram as mudanças de nossa sociedade do início dos anos 2000 para cá.

LEGISLAÇÃO

Já existia o problema do celular ao volante. O que mudou? Agora, com os smartphones e seus diversos aplicativos, o hábito virou quase um problema de segurança pública. Com Waze, WhatsApp, Instagram, etc, as pessoas se recusam a abandonar seus telefones, o que torna o trânsito ainda mais caótico do que já é e aumenta as ocorrências de acidentes.


A legislação, porém, não acompanhou essa evolução. Como em 2000, é proibido usar o celular ao dirigir. Em contrapartida, houve melhorias nas regras quanto ao transporte de crianças no carro. Agora, há dispositivos adequados para os pequenos, e esses acessórios mudam conforme a idade e tamanho (assentos de elevação, cadeirinhas, etc). Naquela época, a ordem era transportar os pequenos no banco de trás.

Há uma cena, inclusive, que mostra uma intrometida Helena, chata como toda Helena de Manoel Carlos, bancando a guardiã do politicamente correto. No trânsito, ela aborda uma outra motorista, que levava uma criança na frente do carro, para chamar sua atenção: “É perigoso, moça. Criança tem de ir atrás”, fala à interlocutora, com ares meio agressivos.

RELAÇÕES HUMANAS


O comportamento de Helena em relação à motorista desconhecida talvez reflita o início da intolerância que veio a dominar nossa sociedade, algo potencializado pelas redes sociais. No mundo cada vez mais virtual, as pessoas têm mais voz e, sem o medo sempre despertado pelo cara a cara, falam o que querem e agridem sem pudores.

Atrás de seu computador, tablet ou smartphone, todo mundo é valente, e virou algo comum as pessoas acharem que podem não apenas opinar sobre a vida alheia – seja a de uma pessoa conhecida ou não -, como também agredir o alvo da crítica.

E quanto ao exibicionismo? Hoje, as pessoas não vão a uma festa, uma viagem, um show ou um restaurante, sem registrar devidamente o fato nas redes sociais. Não importa a realidade, apenas a impressão. A imagem de sucesso. Só vale ser popular no Instagram.


Em 2000? Naquela época, quem queria falar algo, bom ou ruim, tinha de falar na cara. Precisando conversar com a mãe, irmão, marido, namorado, amigo? Só por telefone, ouvindo a voz e sentindo as reações do interlocutor. Ou marcando um encontro. Sem covardia.

E, assim, o mundo parecia mais tolerante, mais inocente, mais romântico, até. E mais divertido. Sem possibilidade de postar, as pessoas faziam algo porque gostavam, e para se divertirem. Apenas isso. E viam o mundo com seus próprios olhos, não pelas lentes do smartphone.

ECONOMIA


Após o acidente com Helena, Edu conta a ela, bravo, que pagou R$ 100 mil no Z3. Hoje, um Z4, seu sucessor, custa R$ 257.950. Uma bela diferença, não? No mesmo ano, eu ganhei meu primeiro carro, um Chevrolet Celta, pelo qual foi pago R$ 10 mil. Atualmente, um veículo de entrada, sem nenhum equipamento de conforto, sai por R$ 30 mil.

Há quem diga que o segundo governo Fernando Henrique foi ruim. E que houve uma crise. No primeiro capítulo de “Laços”, mostra-se que estava bastante difícil para os recém-formados ingressarem no mercado de trabalho. O filho mais velho de Helena, Fred, é engenheiro, e não consegue emprego.

De todo modo, me lembro que aquela época era bastante próspera, sem inflação desenfreada e com a moeda nacional valorizada.


Foi a época de privatizações que permitiram às pessoas não só terem telefone fixo, mas também celular. E também da chegada das montadoras chamadas newcomers, encerrando a hegemonia do quarteto VW/Fiat/Chevrolet/Ford. Até Audi e Mercedes começaram a produzir carros aqui – projeto que abandonaram em meados daquela década, e que agora retomam.

Lembro-me, também, de pagar menos de R$ 1 pela coca-cola que tomava enquanto assistia “Laços de Família”. E de gastar cerca de R$ 50 por um jantar em restaurante de ótimo nível. No supermercado? O valor total da compra semanal nunca passava dos R$ 50, e os produtos não são tão diferentes dos que adquiro hoje, quando gasto o triplo.

Claro que houve inflação, não só aqui, mas também em países desenvolvidos. Mas a impressão, naquela época, era de que nosso dinheiro valia mais do que hoje.


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Testes de colisão validam a segurança de um carro; entenda como são feitos

Saiba quais são os critérios utilizados para considerar um automóvel totalmente seguro ou não

03 de mai, 2024 · 2 minutos de leitura.

Na hora de comprar um carro zero-quilômetro, muitos itens são levados em conta pelo consumidor: preço, complexidade de equipamentos, consumo, potência e conforto. Mas o ponto mais importante que deve ser considerado é a segurança. E só há uma maneira de verificar isso: os testes de colisão.

A principal organização que realiza esse tipo de avaliação com os automóveis vendidos na América Latina é a Latin NCAP, que executa batidas frontal, lateral e lateral em poste, assim como impactos traseiro e no pescoço dos ocupantes. Há também a preocupação com os pedestres e usuários vulneráveis às vias, ou seja, pedestres, motociclistas e ciclistas.

“Os testes de colisão são absolutamente relevantes, porque muitas vezes são a única forma de comprovar se o veículo tem alguma falha e se os sistemas de segurança instalados são efetivos para oferecer boa proteção”, afirma Alejandro Furas, secretário-geral da Latin NCAP.

As fabricantes também costumam fazer testes internos para homologar um carro, mas com métodos que divergem do que pensa a organização. Furas destaca as provas virtuais apresentadas por algumas marcas.

“Sabemos que as montadoras têm muita simulação digital, e isso é bom para desenvolver um carro, mas o teste de colisão não somente avalia o desenho do veículo, como também a produção. Muitas vezes o carro possui bom design e boa engenharia, mas no processo de produção ele passa por mudanças que não coincidem com o desenho original”, explica. 

Além das batidas, há os testes de dispositivos de segurança ativa: controle eletrônico de estabilidade, frenagem autônoma de emergência, limitador de velocidade, detecção de pontos cegos e assistência de faixas. 

O resultado final é avaliado pelos especialistas que realizaram os testes. A nota é dada em estrelas, que vão de zero a cinco. Recentemente, por exemplo, o Citroën C3 obteve nota zero, enquanto o Volkswagen T-Cross ficou com a classificação máxima de cinco estrelas.

O que o carro precisa ter para ser seguro?

Segundo a Latin NCAP, para receber cinco estrelas, o veículo deve ter cinto de segurança de três pontos e apoio de cabeça em todos os assentos e, no mínimo, dois airbags frontais, dois laterais ao corpo e dois laterais de cabeça e de proteção para o pedestre. 

“O carro também precisa ter controle eletrônico de estabilidade, ancoragens para cadeirinhas de crianças, limitador de velocidade, detecção de ponto cego e frenagem autônoma de emergência em todas as suas modalidades”, revela Furas.

Os testes na América Latina são feitos à custa da própria Latin NCAP. O dinheiro vem principalmente da Fundação Towards Zero Foundation, da Fundação FIA, da Global NCAP e da Filantropias Bloomberg. Segundo o secretário-geral da entidade, em algumas ocasiões as montadoras cedem o veículo para testes e se encarregam das despesas. Nesses casos, o critério utilizado é o mesmo.

“Na Europa as fabricantes cedem os carros sempre que lançam um veículo”, diz Furas. “Não existe nenhuma lei que as obrigue a isso, mas é como um compromisso, um entendimento do mercado. Gostaríamos de ter esse nível aqui na América Latina, mas infelizmente isso ainda não ocorre.”