Falamos muito dos preços exagerados das coisas no Brasil, o que é um fato. Para mim, nada é mais sintomático do que as tarifas exorbitantes cobradas pelas companhias aéreas. Entendo que, quando aumenta a demanda, aumentam os preços. Mas é mesmo justo cobrar cerca de R$ 2.500 (ida e volta) por uma ponte aérea entre São Paulo e Rio de Janeiro no período do carnaval?
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Estamos falando de um voo de cerca de 450 km. Para comparação, Iberia e Air China estão cobrando cerca de R$ 1.800, ida e volta, por um bilhete para Madri e Amsterdã, partindo de São Paulo (veja aqui). Neste caso, a distância é de quase 10 mil quilômetros e são cerca de 11 horas de voo, não 45 minutos, caso da ponte aérea. Mais: cada voo inclui duas refeições completas, não apenas um pacote de amendoim ou barra de cereais.
A coisa fica mais feia quando falamos dos programas de milhagem. Nas duas principais companhias aéreas do Brasil, simplesmente não há mais regras. Há uns quatro, cinco anos, era possível emitir, na Tam, um trecho nacional ou para América do Sul por cerca de 10 mil milhas, desde que a emissão fosse feita com pelo menos uma semana de antecedência.
Aí, houve a tal fusão com a Lan e as regras mudaram – o que talvez tenha ocorrido até um pouco antes disso. Criaram as tarifas promocionais. Na teoria, é até possível emitir um bilhete nacional por 5 mil milhas o trecho na véspera da partida. A realidade, porém, é que junto com essas promoções, vieram as tarifas irrestritas. E elas são simplesmente o que a companhia acha que devem ser. São Paulo – Rio por 30 mil milhas o trecho? Check. 30 mil milhas, uns anos atrás, era um trecho entre São Paulo e Madri (agora, nem sonhe com isso, a não ser que você dê muita sorte).
E a tarifa irrestrita fez com que a restrita, ou promocional, ficasse cada vez mais rara. A realidade é que é quase impossível encontrá-la em datas mais concorridas – eventualmente, até nas nada concorridas. Mesmo procurando com duas, três, quatro semanas de antecedência. Exceções são feitas para os portadores dos cartões de viajantes frequentes de topo do programa Fidelidade, ou Multiplus Fidelidade (Vermelho, Vermelho Plus e Black). Já é um começo, uma vez que a premissa do programa é fidelização.
Na Gol a situação não é diferente. Eu diria que, no caso dos voos nacionais, até pior. Tente entrar agora no site do programa Smiles e emitir uma passagem entre São Paulo e Porto Seguro no feriado de 1º de maio. Até tem uma coisa ou outra pelas 10 mil milhas padrões, geralmente com diversas conexões. A maioria, porém, “custa” 20 mil milhas, ou mais. Estamos falando de maio. Ou seja: a busca se enquadra nos padrões de “feita com antecedência”.
Emitir um trecho nacional, com Smiles, está se transformando em um negócio ruim. Geralmente, só se consegue a “proeza” de resgatar bilhetes promocionais (de 5 a 9 mil milhas) ou com milhagem padrão (10 mil milhas) nos voos em datas menos concorridas, mais baratos. Justamente aqueles que estamos dispostos a pagar para, adivinhem? Acumular milhas no programa de fidelização.
Para comparação: no mesmo Smiles, emitir um trecho entre São Paulo e Miami, voando com a Delta, parceira da Gol, sai por 25 mil milhas. É muito difícil de encontrar, mas, quando há, é este o “valor”. Então como pode um São Paulo – Recife sair por 30 mil milhas, algo que ocorre com frequência no verão?
COMPANHIAS INTERNACIONAIS
A bagunça com programa de milhagem é quase exclusividade das aéreas brasileiras. Nas “gringas”, geralmente, há duas tarifas para cada classe de viagem (executiva, econômica, primeira): baixa ou alta temporada. Quanto aos preços? As companhias americanas e europeias, com as quais estou mais habituada (por isso, falarei sobre elas apenas), também têm seus momentos de valores exorbitantes, seguindo padrões semelhantes: datas mais procuradas e voos marcados sem antecedência.
E quando falamos na necessidade de se trocar um voo, a coisa fica feia em qualquer lugar. Já sabemos que há taxa para troca e que se cobra também a diferença de tarifa. Cientes disso, tentamos comprar nossos bilhetes sem necessidade de alterações. Contratempos, porém, acontecem. E aí, meu amigo, é um verdadeiro purgatório.
Exemplo recente é o que aconteceu em um voo que fiz com a Swiss. Longe de mim querer usar esta que é considerada a melhor companhia da Europa (e, na maioria dos quesitos, faz jus a seu título) como bode expiatório. Até porque este incidente certamente ocorreria com qualquer outra aérea. Mas vamos à história.
Meu bilhete, emitido por agência, era complicado, cheio de conexões: São Paulo – Zurique – Estocolmo – Skelleftea. Três voos, duas conexões. Na ida, tudo certo. Com conexões de pelo menos uma hora e meia, cheguei a meu destino.
Então, notei que, na volta (Skelletea – Estocolmo – Zurique – São Paulo), a última conexão, na cidade suíça, era de apenas 40 minutos. E estamos falando de um voo internacional, ou seja: em Zurique, eu teria de fazer checagem de segurança e imigração. Isso em 40 minutos, ou menos, já que as portas do avião se fecham bem antes.
Tentei, então, antecipar meus voos em Skelleftea e Estocolmo. Era possível. Havia uma infinidade de opções. Por meio da agência, informei à companhia que não me importaria de ficar seis horas aguardando meu voo para São Paulo no aeroporto de Zurique, se fosse o caso. E que eles poderiam até me rebaixar para a econômica (o bilhete era de executiva) nos trechos europeus.
Deixei claro que precisava chegar a São Paulo na data prevista. Se perdesse o voo em Zurique, só poderia voar na noite seguinte, quando partia o próximo voo à capital paulista, na qual chegaria com um dia de atraso.
A resposta da Swiss: a conexão é segura e garantida. Embora os portões de embarque feche 20 minutos antes da partida do voo, os passageiros provenientes de conexão podem embarcar até três minutos antes. E, se ainda assim, eu insistisse em antecipar os bilhetes partindo de Skelleftea e Estocolmo, teria de pagar US$ 2.500, sendo cerca de US$ 300 em taxa de remarcação e aproximadamente US$ 2.200 de diferença de tarifa.
Primeiro ponto: US$ 2.500 é quase o preço de um novo bilhete, ida e volta, emitido com antecedência. De executiva, não de econômica.
Segundo ponto: estávamos falando da remarcação de dois trechos europeus, mais baratos, e não do trecho intercontinental. No Brasil e nos EUA, pelo menos, é muito comum a antecipação dos voos no próprio balcão. É bom para a própria companhia, que libera assentos para venda no voo seguinte. Tentamos também essa solução, chegando mais cedo ao aeroporto de Skelleftea. Sem sucesso, mesmo havendo lugares disponíveis no voo.
Terceiro ponto: a Swiss pode argumentar com sua própria eficácia nas conexões, o que nunca cheguei a experimentar, como explicarei abaixo, na hora de marcar uma conexão de 40 minutos para voo internacional. Mas como pode garantir que não haverá fatores que levem ao atraso de voos? Principalmente em um rigoroso inverno europeu, quando é muito comum os aeroportos fecharem por causa de neblina.
Foi o que ocorreu, evidentemente. E, durante todo o trajeto, eu tinha certeza de que isso aconteceria. Na chegada a Estocolmo, fomos informados de que o voo a Zurique estava com pelo menos meia hora de atraso. Portanto, perderíamos o voo seguinte, de Zurique a São Paulo.
A recomendação da atendente no balcão era que embarcássemos a Zurique e, lá, a Swiss providenciaria hospedagem para que pudéssemos embarcar no dia seguinte a São Paulo. A primeira recomendação da loja responsável pela emissão de passagens da companhia em Estocolmo, para onde fomos encaminhados, era a mesma.
Argumentaram que nada podiam fazer, uma vez que o próximo voo a São Paulo seria só no dia seguinte.
Eu argumentei também. Expliquei toda a negociação da agência que emitiu meu bilhete (chegamos também a conversar diretamente com a Swiss) durante os dois dias anteriores. Insisti e sugeri que remarcassem meu bilhete, mesmo que fosse por meio do sistema de endosso, para voar ao Brasil com outra companhia aérea. Por fim, depois de muito debate, conseguiram nos colocar, nos últimos minutos, em um voo a Munique e, de lá, no mesmo dia, a São Paulo. De Lufthansa, empresa que pertence ao mesmo grupo da Swiss.
O que me assustou em tudo isso foi a intransigência. Por que a companhia insistiu na conexão curta, sendo que perder o voo resultaria em custos com hospedagem, alimentação e, dependendo da situação, transporte, ao passageiro? Por que não antecipar os voos provenientes das cidades suecas a fim de liberar assentos nos seguintes?
Por que, até mesmo em uma situação que privilegia a própria companhia, não apenas os passageiros, é preciso cobrar tarifas exorbitantes, quase equivalentes a um novo bilhete?
Enquanto isso, a vida do passageiro vira uma verdadeira provação. Não bastassem os procedimentos de segurança nos aeroportos, extremamente necessários e inevitáveis, mas que tornam a longa viagem ainda mais cansativa, o passageiro tem de enfrentar correria, discussões por meio da central de atendimento, no balcão ou na loja da companhia, ou ainda pagar valores impraticáveis, a fim de chegar a seu destino.
Isso fora os preços altos, os abusos dos programas de fidelização…
Qual é a solução? Não voar? Isso não é uma opção para a maioria. Há locais que só são acessíveis por meio de aviões. Há pessoas que precisam voar. Somos, então, reféns das companhias aéreas? Onde estão os órgãos de regulamentação nacionais e internacionais? E quando alguém vai fazer algo a respeito dessas intransigências? Porque é uma relação desigual, a favor da empresa prestadora de serviço, não do consumidor.
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