Primeira Classe

Veículos elétricos não resolveriam crise atual

Crise vai muito além do risco de escassez de combustível, e não seria solucionada com veículos elétricos

Rafaela Borges

24 de mai, 2018 · 8 minutos de leitura.

Veículos elétricos Nissan Leaf" >
Veículos elétricos
Crédito: Nissan Leaf virá ao Brasil, mas não para resolver problema de escassez de combustível em tempos de crise (Foto: Toru Hanai/Reuters)

Os veículos elétricos conseguiriam resolver a crise atual? Se formos considerar um dos problemas pontuais, que são filas em postos e risco de escassez de combustível, sim.

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Por outro lado, essa crise vai muito além do racionamento de combustível. Ela é sobre impostos, principalmente. Algo importante a se debater no Dia da Liberdade de Impostos, nesta quinta-feira (24).

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É também sobre a alta do dólar. No momento, esse fenômeno tem mais a ver com a valorização da moeda americana do que com a desvalorização da brasileira.

Por fim, é uma crise sobre conjuntura. Nos últimos dias, ouviu-se muito dizer que, se o Brasil tivesse ferrovias, esses problemas não estariam ocorrendo.

Em parte, isso pode ser verdade, mas o fato é que o transporte no Brasil é feito essencialmente por caminhões. Essa é a realidade. Uma boa malha ferroviária não se cria do dia para noite.


Nos últimos dias, ficou claro que as reivindicações de caminhoneiros têm de ser ouvidas. Não vou entrar no mérito do que o governo pode ou não conceder, mas é fato que algumas concessões precisam ser feitas.

Afinal, é um movimento que está mexendo muito com o dia a dia do brasileiro (e com a própria renda dos caminhoneiros, que estão deixando de trabalhar). Não é só racionamento de combustível que as paralisações e bloqueis efetuados pela classe está gerando. Nem apenas o trânsito provocado em cidades e rodovias pelas paralisações.

É risco de escassez de todo produto que depende de transporte. Em supermercados, já há relatos de falta de diversos alimentos. Isso pode ser ainda mais grave que a falta de combustível.


 

VEJA TAMBÉM: OS PREÇOS DOS CARROS NO BRASIL SEM IMPOSTOS

 


Por que os veículos elétricos não resolveriam o problema?

Se, utopicamente, a frota brasileira fosse hoje toda composta por veículos elétricos (mesmo ônibus e caminhões), não teríamos filas nos postos de combustível, algo que estamos vendo desde a noite desta quarta-feira (23).

Mas teríamos as paralisações de caminhoneiros? Eu creio que sim. Uma das razões que levou ao movimento foi a alta do dólar, que impactou no preço dos combustíveis.

Com caminhões a energia elétrica, a alta do dólar geraria impacto na vida do caminhoneiro? Sim, geraria. Embora a moeda americana tenha menos influencias nas contas de luz, esta também é impactada.


Principalmente se a energia elétrica for fornecida pela usina de Itaipu. Isso, inclusive, já ocorreu no País, em 2015 (confira aqui).

Ou seja: é possível que ainda houvesse risco de escassez de outros produtos, além do combustível (até hospitais estão sendo afetados pelos bloqueios).

Por fim, a principal reivindicação dos caminhoneiros é a redução de impostos. São essas taxas que têm impacto alto nos produtos vendidos no Brasil, que são caros para a renda da população. Vale lembrar que, em muitos setores, os impostos brasileiros são considerados os mais altos do mundo.


Além disso, a energia que alimenta o veículo puramente elétrico (porque os híbridos têm motor a combustão) não vem do nada. Ela também tem uma fonte.

Como reabastecer os veículos elétricos?

Os veículos elétricos têm como principal fonte de energia a tomada. Na Europa e nos EUA, onde são um pouco mais comuns, há mais postos de recarga rápida.

Além disso, nessas regiões, é cada vez mais comum a construção de novos prédios com tomadas na garagem. Assim, as baterias dos veículos elétricos podem ser recarregadas durante a noite, por exemplo.


Mas, sobre a energia elétrica, no Brasil, recai tantos impostos quanto nos combustíveis (ou até mais).

Para comparação, o ICMS (estadual) em sua conta de luz pode chegar a 30%, ante os 35% da gasolina, 25% do diesel e 30% do etanol.

Para todos esses produtos, há PIS e Cofins (federais). No combustível, há o Cide. Na energia elétrica, os municípios podem cobrar uma taxa chamada de CIP.


Tempos de racionamento

Crises de fornecimento de energia no Brasil são constantes, principalmente em tempos de seca, mais comuns no inverno.

Nessas épocas, o preço da energia elétrica aumenta. São as chamadas bandeiras. Na vermelha, quando o fornecimento está em estado crítico, são cobrado R$ 0,045 extras a cada KWh fornecido.

Imagine, então, com uma frota só de carros elétricos, aumentando a demanda por energia? As bandeiras vermelhas seriam mais constantes.


Além disso, em postos de recargas rápidas, sempre haveria aqueles que aproveitariam a crise para aumentar o preço do KWh (como está ocorrendo agora com os combustíveis).

Veículos elétricos vão existir em massa, mesmo no Brasil. É um caminho sem volta. Não é só sobre reduzir a dependência do carro a combustão, mas também sobre reduzir os índices de poluição (esse é o principal objetivo).

Porém, assim como as ferrovias, os veículos elétricos não são as respostas para a crise que temos hoje. Trata-se de uma crise que expõe dois graves problemas do Brasil: conjuntura e alta carga tributária.


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