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Carro popular no Brasil é coisa do passado, o foco é o conteúdo tecnológico
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Carro popular no Brasil é coisa do passado, o foco é o conteúdo tecnológico

Segundo especialista da FGV em conversa com o Jornal do Carro, montadoras não pretendem lançar carro popular e sim modelos cheios de chips

Diogo de Oliveira

17 de mai, 2023 · 10 minutos de leitura.

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Polo Track
Polo é vendido em várias configurações de acabamento e pega desde clientes do segmento de agronegócios até os que buscam esportividade
Crédito:Leo Souza/Estadão

Por décadas, o Brasil foi dominado pelo chamado carro popular. Gol, Palio, Uno, Fox, Celta, Corsa e Ka são alguns dos modelos que, até o início do século, dominavam os emplacamentos de veículos 0-km no País. Entretanto, já faz algum tempo que o mercado brasileiro mudou. De 2015 para cá, por exemplo, os SUVs dispararam nas vendas. Mas não é só uma questão de tamanho. O carro popular de hoje não é mais (e nem será) tão básico e barato.

O preço baixo não é mais o objetivo das montadoras. É um fenômeno mundial. Atualmente, o conteúdo tecnológico se tornou imperativo na disputa entre as marcas e modelos. O número de chips mais que duplicou nos carros de entrada. Ou seja, esqueça o carro popular de antigamente. Por força da lei, os novos modelos vêm de fábrica com ABS e airbags frontais. Além disso, a partir de 2024, terão de incluir o controle eletrônico de estabilidade (ESC).



carro popular fábrica Toyota
Fábrica da Toyota em Sorocaba (SP) produz a linha Yaris e o Corolla Cross, que parte de R$ 159.890 (Vagner Aquino/Estadão)

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Carro popular não vai voltar

Essa evolução na segurança tem um preço. Por isso, é pouco provável que o Brasil volte a ter carros 0-km com preços de cinco anos atrás. Por exemplo, o Renault Kwid. O hatch feito em São José dos Pinhais, no Paraná, é atualmente o carro mais barato do Brasil, com tabela inicial de R$ 68.990. Em 2017, quando estreou no País, o subcompacto custava a partir de R$ 29.990 na versão básica. Em 2022, após receber reestilização, saltou para R$ 59.890.

“Houve uma mudança profunda no setor automotivo. A rota de digitalização dos carros e serviços implicaram em mudanças significativas e no aumento de custo em diversas partes, sobretudo em relação aos componentes. Isso vem desde o início da pandemia, com paralisações de fábricas, greves e aumento de custos de logística”, resume o coordenador dos cursos da área automotiva da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Antônio Jorge Martins.

Segundo o professor e especialista em indústria, “qualquer produto que passe pela digitalização vai aumentar a quantidade de semicondutores”. Ou seja, com a maior demanda por chips, que era prioridade apenas para alguns fabricantes, o custo deste componente logicamente encareceu. “Então, temos a questão da logística, fretes, aumento de preço dos semicondutores. E as montadoras fizeram o repasse desse aumento de custo”, aponta Martins.


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Fenômeno é global

As marcas mudaram de estratégia. Praticamente todas deixaram de focar em volume. Com isso, deixaram de priorizar o preço. E, assim, todas as fábricas estão ajustando a produção para essa nova realidade. “As montadoras adequaram o nível de produção em busca de rentabilidade. Há de se convir que o produto com menos tecnologia precisa evoluir. E isso exige investimentos contínuos, o que só acontece quando se tem a tal da lucratividade”, completa Martins.

Ou seja, com o aumento dos custos em todas as partes, o que incluí a eletrificação dos carros, tudo foi repassado ao consumidor nos preços. E o custo do estoque de um produto mais caro é difícil de repassar. Dessa forma, na medida em que deixaram de buscar volume, as marcas passaram a utilizar os chips disponíveis nos veículos com maior conteúdo tecnológico. E o foco passou a ser a camada da sociedade que consegue absorver”, raciocina Martins.


Poder de compra encolheu

O problema é que essas mudanças criaram um abismo entre os preços praticados e o poder de compra da população. “Quando ocorre a desvalorização da nossa moeda, tem que repassar o custo. Em 2020, o dólar estava em R$ 4,00. Hoje, flutua em R$ 5,00. Até 2022, as marcas vendiam sob encomenda. Mas, em determinado momento, passaram a oferecer carros com menor volume e mais tecnologias. E os preços dispararam”, recorda Martins.

Mas não é só a alta de preços que compromete a indústria automobilística no momento. Não houve adequação ao novo nível de mercado. O custo de financiamento dos veículos novos disparou. Por isso, o Banco Central está em fase de redução de juros, enquanto o resto do mundo está subindo juros. Ou seja, nossa taxa é mais consequência global que nacional. O problema é que temos uma população com baixo poder de compra e um custo financeiro elevado”, sintetiza o professor da FGV.

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E o carro popular de R$ 60 mil?

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai anunciar um plano de ação no próximo dia 25 de maio para tentar baixar os preços dos carros novos. Entretanto, lideranças da equipe, como o vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, reconhecem que o carro popular de R$ 50 mil está difícil. Já se fala em modelos de R$ 60 mil. Para Antônio Jorge Martins, isso só acontecerá se houver redução nos custos de produção.

“Só será possível baixar os preços dos carros 0-km se houver redução dos custos de componentes que implicaram na formação do novo preço de venda. Outro fator que tem impacto direto é a valorização do real brasileiro frente ao dólar norte-americano”, sugere Martins. Do lado do governo Lula, a meta é ter pelo menos um modelo por cerca de R$ 55 mil, segundo fontes ouvidas pelo Estadão. Para isso, as lideranças tentam envolver os Estados com cortes no ICMS, medida que se somaria à redução do IPI (imposto federal) sobre os veículos.

Para o professor da FGV, estamos diante de uma nova cultura automotiva que o mercado não tinha vivência. “Os carros evoluíram, mas não com a periodicidade de antes. As montadoras lançam novas séries a todo tempo. Por isso, hoje o consumidor exige evolução. E os carros tendem a ser cada vez mais um celular sobre rodas”, compara Martins.


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