A nova geração do hatch Fiesta começou sua carreira importada do México em 2011. Dois anos depois, chegava a versão nacional, inicialmente feita em Camaçari (BA).
O Fiesta brasileiro chegou com duas grandes inovações. Foi o primeiro do segmento de hatches compactos nacionais a trazer sistema eletrônico de estabilidade (ESP). Além disso, incorporava o câmbio automatizado de duas embreagens, até então exclusividade em modelos mais caros, sobretudo importados.
Pouco tempo depois, o câmbio automatizado se tornaria o fardo do Fiesta. Posicionado como um modelo premium (acima dos de entrada e sem versão 1.0), o hatch tinha na versão sem pedal de embreagem um grande apelo.
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E de repente, esse câmbio, batizado de Powershift, começou a dar problemas que a Ford parecia não ser capaz de solucionar. Não só no Brasil: a falha era mundial, e lá fora a transmissão logo deixou de ser oferecida.
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Ford com câmbio automatizado Powershift
A transmissão de dupla embreagem Powershift deu e dá tantos problemas que está muito longe de ser uma boa opção de compra no mercado de usados, nem levando-se em conta que a Ford estendeu para dez anos a garantia do sistema. A montadora está abandonando esse tipo de câmbio, tanto que o novo EcoSport passou a empregar sistema convencional, com conversor de torque. Além do Eco anterior, o Fiesta e o Focus também utilizam sistema Powershift.
Effa M100
A Effa estreou no Brasil há dez anos, com o M100. Mas o modelo tinha desempenho fraco, acabamento simples demais e pouca estabilidade, além de baixa qualidade. Não durou no mercado, e não tem motivos para ser considerado como opção no mercado de usados.
Fiat com câmbio automatizado
Lojistas evitam pegar modelos da Fiat com câmbio Dualogic, automatizado. Diferentemente do sistema da Ford, o problema dos Fiat não é quebra, mas lentidão nas trocas. A foto é de um Punto, mas poderia ser também do Palio, Stilo, Siena, Linea, etc.
JAC J5
O lojista Álvaro Mari, da Primo's Car, evita veículos chineses em geral em sua loja, na Zona Norte de São Paulo. No caso do J5, há outras razões: o motor 1.5 está subdimensionado para o modelo. E a JAC está paralisando a importação de seus modelos urbanos (J2, J3 e J3 Turin), e o J5 pode entrar na lista. A ideia é concentrar esforços nos SUVs, caso do T40 e T5 e T6.
Citroën DS5
Na loja multimarcas Trans-Am Faraj, na Zona Norte, um reluzente Citroën DS5 já completou um ano no estoque. O motivo pode estar na falta de teto solar, item considerado indispensável nesse tipo de automóvel. Sem ele, o carro vira mico.
Geely EC7
A foto é do sedã EC7, mas poderia ser a do compacto GC2. A Geely teve vida muito curta no País. Chegou em 2014 e partiu em 2016. Sem representação, a assistência técnica (peças e mão-de-obra) torna-se uma incógnita.
Chevrolet Agile com câmbio automatizado
O câmbio automatizado na Chevrolet, batizado de Easytronic, equipou Agile e Meriva, e não deixou saudades. As trocas eram demoradas e feitas com trancos, motivo pelos quais os modelos são evitados pelos lojistas.
Lifan 320
O 320 (a foto é do modelo 2010) era uma cópia de baixíssima qualidade do Mini, que parou de ser importado. Com isso, a desvalorização aumentou muito. Lojistas e seguradoras não querem correr riscos com modelos assim.
Volkswagen com câmbio automatizado
A foto é do Voyage, mas também poderia ser do Fox, do Gol, do Polo... O câmbio automatizado da Volkswagen também não é muito bem visto pelos lojistas, por causa das demoras nas trocas de marcha.
Chery Celer
Os carros da Chery também não escapam da rejeição dos lojistas, a exemplo do que ocorre com outros chineses. É o caso do comerciante Álvaro Mari, da Primo's Car, que evita comprá-los, por saber que a revenda será complicada.
Os detalhes sobre os problemas do câmbio Powershift você pode ler aqui.
Quando a Ford lançou o novo Ka (terceira geração brasileira), em 2015, transferiu a produção do Fiesta de Camaçari para São Bernardo do Campo (SP). A planta baiana ficou responsável pela produção do hatch de entrada e do EcoSport.
Logo, o Fiesta deixou de ser o Ford mais vendido, posto que foi assumido para o Ka. O novo hatch pequeno, que não havia feito sucesso na primeira geração (aquela com visual polêmico, com, a tampa do porta-malas achatada) e melhorara na segunda, havia se tornado um sucesso e tanto.
Estratégias da Ford
O que você vai ler agora é minha análise sobre as estratégias que a Ford adotou e que, na minha opinião, levaram ao fim do Fiesta.
O segmento de hatches premium, que ia de vento em popa, viu as vendas despenarem nos anos que sucederam a chegada do Ka.
O Chevrolet Sonic deixou de ser oferecido no Brasil e o Fiat Punto já não brilhava mais como antigamente (logo, sairia de linha). Peugeot 208 e Citroën C3 também não vendiam bem.
A impressão é de que, para a Ford, pareceu ser mais negócio investir todas as fichas no EcoSport e no então novo Ka. Foi assim que, em 2017, a marca decidiu retirar do SUV (integrante do segmento mais badalado do País) o câmbio Powershift.
VÍDEO: Ka Sedan automático em detalhes
Pouco tempo depois, o Fiesta foi atualizado, recebendo mudanças mecânicas e uma central multimídia decente. Esse sistema já estava disponível na versão de topo do sedã, mas a Ford demorou demais para colocá-la no hatch. Foi preciso chegarem o Argo e o Polo, para reanimarem o segmento. Sobre os novos concorrentes, falaremos mais abaixo.
Vale lembrar que, na Europa, o Fiesta já tinha nova geração, que a Ford decidiu não lançar aqui. Acredito que essa decisão já sinalizava que a marca não apostaria mais fichas altas no carro.
Isso, porém, não foi o principal problema. Afinal, o Fiesta brasileiro ainda era atual.
A “bomba” mesmo foi a decisão da Ford de manter o câmbio Powershift no modelo. À época, escrevi uma análise sobre o tema. Na minha opinião, foi um erro, até porque na época ainda não havia indícios de que a marca pretendia tirar o Fiesta de linha.
Afinal, quem faz mudanças em um carro que vai deixar o mercado um ano depois? As mudanças, ainda que sutis, geram custos.
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20º NISSAN SYLPHY
476.306 unidades
19º WULING HONGGUANG S1
480.455 UNIDADES
18º KIA SPORTAGE
482.623 UNIDADES
17º NISSAN QASHQAI
513.192 UNIDADES
16º VOLKSWAGEN LAVIDA
513.371 UNIDADES
15º HONDA ACCORD
560.872 UNIDADES
14º TOYOTA HILUX
560.872 UNIDADES
13º HYUNDAI TUCSON
574.054 UNIDADES
12º RAM SERIES
624.846 UNIDADES
11º HYUNDAI ELANTRA
650.803 UNIDADES
10º CHEVROLET SILVERADO
651.090 UNIDADES
9º TOYOTA CAMRY
661.383 UNIDADES
8º VOLKSWAGEN POLO
725.463 UNIDADES
7º HONDA CR-V
747.646 UNIDADES
6º VOLKSWAGEN GOLF
789.519 UNIDADES
5º VOLKSWAGEN TIGUAN
791.275 UNIDADES
4º HONDA CIVIC
823.169 UNIDADES
3º TOYOTA RAV4
837.624 UNIDADES
2º FORD F-SERIES
1.080.757 UNIDADES
1º TOYOTA COROLLA
1.181.445 UNIDADES
Fiesta x Ka
Antes da chegada do Polo e do Argo, enquanto os hatches premium não iam bem, o segmento formado por carros como Onix e HB20 explodia. Esses modelos ficavam entre os de entrada (na época, Uno, Up! e até mesmo o Gol) e os compactos mais sofisticados.
Eles tinham versões 1.0, diferentemente de Fiesta, 208 e cia. Além disso, já saiam de fábrica pelo menos com o básico (ar, direção e travas e vidros dianteiros elétricos).
Em vez de rebaixar o Fiesta, a Ford fez um “upgrade” no Ka quando ele mudou de geração. E deu certo. Atualmente o modelo briga com o HB20 pelo posto de segundo mais vendido do Brasil.
Então, veio o ano de 2017 e o Fiesta precisava de atualizações para ter alguma chance de continuar existindo, ainda que com vendas não muito altas.
A impressão é de que a Ford teve de fazer uma escolha: colocar câmbio automático de seis marchas no Ka ou no hatch premium. E escolheu aquele que passou a ser seu carro mais vendido para receber a melhor transmissão (no início de 2018).
Ao Fiesta, restou manter o Powershift. E tentar sobreviver assim.
Polo e Argo
Argo e Polo, que têm versões básicas, mas também opções premium (rivais do Fiesta), estão fazendo muito sucesso. Ambos figuram entre os dez mais vendidos do País.
O Fiesta poderia ter sido “o Polo da Ford”. Se a Ford tivesse, à época, a sacada de lançar uma versão de entrada, com motor 1.0, o modelo poderia ter feito o sucesso que o Volkswagen faz agora.
Mas a Ford preferiu ter o Fiesta como um hatch compacto premium. A estratégia poderia ter dado certo, se não fosse a crise na qual o País mergulhou a partir de 2014, que derrubou as vendas de carros novos.
Há poucas semanas, a Ford deixou de oferecer o Fiesta com câmbio Powershift. Ali, já ficava claro que o modelo tinha pouco tempo de vida. Afinal, como pode um hatch premium ter apenas câmbio manual, enquanto o de entrada (Ka) oferecia transmissão automática?
O fim de linha
A notícia veio na semana passada: a Ford vai fechar a fábrica de S. Bernardo e não terá mais operação de caminhões no Brasil. Como o único carro de passeio feito por lá era o Fiesta, ele também dançou.
Penso que, se a Ford não fechasse a planta do ABC, o Fiesta até poderia sobreviver mais alguns anos. O fato é que a marca decidiu focar seus investimentos em picapes e SUVs (uma decisão mundial). Sobrevivem, em cada mercado, os modelos de grande volume, como o Ka, no Brasil.
No caso do Fiesta, com a decisão do fechamento da fábrica, não valia mais a pena insistir. Nos últimos três meses, o modelo teve médias de 700 unidades vendidas, algo bem baixo para o segmento.
Uma pena: foi um produto excelente, que marcou época para a Ford e teve pioneirismo entre os hatches compactos. R.I.P. Fiesta.
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