Primeira Classe

Honda Civic: ovo ou galinha?

Honda Civic vende 'mal' porque produção é baixa ou produção é baixa porque vende 'mal'?

Rafaela Borges

10 de nov, 2017 · 10 minutos de leitura.

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Honda Civic
Crédito: Enquanto o mercado e o Corolla crescem, sedã da Honda perde vendas (Foto: Felipe Rau/Estadão)

O Honda Civic vende “mal”. Mal entre aspas mesmo, porque não dá para dizer isso literalmente. O carro que tem uma média mensal de 2 mil unidades em 2017, com pico de 2.900. Então, olhando para esses números de maneira crua, seria impossível dizer que ele vende mal. Certo? Até porque é o segundo mais vendido do segmento.

Mas um olhar mais profundo no desempenho do sedã médio pode fazer você mudar de ideia. O primeiro ponto é a diferença em relação ao Corolla. O Toyota tem média mensal de 5 mil unidades. Neste ano, já chegou a 6 mil.

Além disso, o Corolla vem registrando, junto com o mercado geral, crescimento de vendas nos últimos meses. Ou seja: enquanto o mercado se recupera, o Corolla segue o baile.

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Com o Honda Civic, a história é diferente. Em junho, o carro ultrapassou pela última vez a casa das 2 mil unidades vendidas. Nos quatro meses seguintes (julho, agosto, setembro e outubro), ficou abaixo disso.

Será que o Honda Civic está entrando em decadência? Será que ele será, enfim, ultrapassado pelo Chevrolet Cruze?

Quando o Civic foi lançado em nova geração, no ano passado, eu fiz uma análise sobre o carro. Nela, avaliava o risco de, por causa dos preços altos, o Civic ser ultrapassado em vendas pelo Cruze.


Neste ano, mensalmente, isso já ocorreu. Em julho o Cruze teve 300 unidades vendidas a mais. Em agosto, houve praticamente um empate técnico. Já nos dois últimos meses, o Honda retomou a dianteira, mas sem vantagem ampla – são sempre menos de 300 unidades à frente do rival.

Porém, neste ano, não há mais possibilidade de o Cruze derrotá-lo. O Honda tem cerca de 22 mil emplacamentos. Os do Chevrolet estão em torno de 15 mil exemplares. É uma vantagem ampla demais. A boa briga deve ficar para o ano que vem.

OVO OU GALINHA?


Mas será que o consumidor perdeu mesmo o interesse pelo Civic? De acordo com a Honda, não perdeu não. O problema é de produção. Ou melhor: de falta de investimento para ampliar as vendas do carro.

Atualmente, a montadora produz em Sumaré cinco produtos: Fit, City, WR-V, HR-V e Civic. O mais vendido é o HR-V, que ultrapassa as 4 mil unidades por mês.

No primeiro trimestre deste ano, chegou o WR-V. A queda do Civic pode estar associada ao lançamento do novo SUV – com emplacamentos de cerca de 1.500 exemplares ao mês.


Isso porque a fábrica está no limite. Então, se chega um, o pensamento óbvio é a necessidade de reduzir a produção de outro. Do Civic?

O segmento de SUVs compactos urbanos, como HR-V e WR-V, é a galinha dos ovos de ouro no Brasil. O lucro é alto.

Feitos em bases de carros  mais populares e com custos mais baixos, os SUVs compactos têm preços bem próximos aos de sedãs médios.


Faz sentido a explicação da Honda? Faz. A montadora esperava, no lançamento da nova geração, vender 2.500 unidades do Civic. Se esta era a meta, ela vinha conseguindo.

Agora, não está conseguindo mais, e isso pode estar ocorrendo por causa de redução de produção impulsionada pela chegada do WR-V. Então, por que a queda só ocorre agora, e não quando o WR-V chegou? Porque antes, é muito provável que houvesse estoque do carro para vender.

Por fim, a Honda de fato não está investindo em ações de varejo para o Civic, para impulsionar suas vendas.


Então, o Civic é ovo ou galinha? Ele vende menos agora porque a produção é baixa ou a produção está mais baixa porque ele está vendendo menos?

O OUTRO LADO

Embora as explicações da Honda sejam totalmente coerentes, não há filas para o Civic nas concessionárias. Carros  com baixa oferta e ampla demanda, como Kwid e Equinox, têm fila de espera.


Então, quais as possíveis razões mercadológicas para o Civic não estar indo bem? Já escutei a seguinte opinião de especialistas: este Civic não deu certo, pois o design é moderno demais e não agrada seu público.

Discordo completamente. O Civic tem design moderno sim, mas a Honda já fez esse teste no passado, com a oitava geração – duas atrás desta. A marca investiu no design ousado e, em vez de afastar clientes, ganhou novos.

Naquela geração, o Civic conseguiu fechar ano completo à frente do Corolla. Foi um sucesso.


A nona geração, porém, foi um retrocesso. Em uma coletiva de imprensa internacional, a própria direção da Honda admitiu o equívoco daquele carro.

Ele foi concebido para ser uma coisa, mas tornou-se outra completamente diferente por demanda de corte de custos. Era um reflexo da obsessão da Honda em superar a Toyota em vendas a qualquer custo, diretriz que agora foi abandonada, também de acordo com a direção da empresa. “A Honda perdeu seu mojo”, disse o CEO da montadora.

Até por isso, a geração atual é, sem dúvidas, um grande avanço em todos os aspectos.


O Civic também tem fama de ser caro demais. Porém, isso só ocorre na versão de topo, por R$ 125 mil. A EX e a EXL, mais vendidas, são compatíveis com o Corolla – elas partem de R$ 98.400.

Mas aí está um problema. A versão do Civic que apresenta um grande diferencial ante o Corolla é a de topo, Touring. Só ela tem motor moderno (1.5 turbo com injeção direta) e diversas tecnologias de ponta que o Toyota não tem.

As demais usam o bom e velho 2.0 aspirado e não têm um grande diferencial tecnológico. Apesar de o Civic ser um carro superior ao Corolla, nas opções mais vendidas ele não traz um grande apelo, portanto.


E, como a geração anterior do Civic não foi lá grande coisa, ele precisaria trazer. Afinal, naquele tempo, o Corolla ganhou muito espaço, e uma clientela ainda mais fiel. Por que esses clientes abandonariam o Toyota para comprar um Civic bem equivalente?

O Civic perdeu seu encanto? Eu acho que perdeu sim! A Honda pode dizer que tem possibilidade de vender mais, se quiser. Mas a verdade é que vemos por aí muitos fãs do Corolla, e poucos do Civic.

Por fim, vem aquela que, para mim, é a explicação mais importante. O segmento de sedãs médios perdeu seu encanto. O Corolla nada contra a maré, e o Civic e o Cruze são os dois outros que ainda conseguem se manter. Os demais estão em decadência mercadológica.


Por quê? Ah, vocês conseguem adivinhar, vai. Por causa dos SUVs, claro. Brasileiro, agora, só quer saber de SUV.

Uma pena. Eu torço pelos sedãs, especialmente pelo Civic. É um carro fantástico, um dos melhores do Brasil. Além disso, tem história rica e muita tradição.

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