No jornalismo, não existe área mais ocupada por homens que a automobilística. Isso nunca foi empecilho para eu construir uma carreira no setor.
(No Instagram: @blogprimeiraclasse)
Nunca nem passou pela minha cabeça a ideia de que o fato de ser mulher poderia consistir em problema. Nunca. E jamais foi um problema, em 13 anos de carreira.
Comecei em 2003, no último semestre da faculdade de jornalismo, em um pequeno site. Não era meu objetivo, e eu nunca tinha me interessado pelo assunto automóvel. Mas não demorou para que eu pegasse gosto por essa área.
Fiz o que todo jornalista deve fazer, em qualquer setor de atuação. Pesquisei, entrevistei, apurei, reportei. Aos poucos, fui cativando fontes na indústria automobilística. Aprendi a avaliar carros: fui descobrindo como identificar as reações do automóvel, e quais são os fatores que influenciam em seu comportamento.
Apaixonei-me pelos carros, e pelo mundo do automóvel. Em 2007, comecei a trabalhar no Jornal do Carro. No ano seguinte, prestes a completar 26 anos de idade, fui promovida a editora assistente. Era uma vaga cobiçada, e eu nunca achei que não tivesse chances de consegui-la por ser uma mulher.
Nesses 13 anos, certamente houve comportamento machista por parte de algumas pessoas. Poucas. Vítima, porém, eu jamais me senti. O fato é que nunca me importei com comentários e atitudes machistas, porque não me afetam, nem me interessam as opiniões e comportamentos baseados em dogmas do século passado. Apenas lamento por quem não consegue adequar seu pensamento às mudanças da sociedade.
No passado, lutaram por nós. Pelo nossos direitos. Pela igualdade e, principalmente, pela liberdade de pensamentos e escolhas. E, meninas, elas venceram. Agora, o sinal está aberto para nós, que somos mulheres. Não temos mais um papel predeterminado na sociedade.
O que devemos fazer? Aproveitar nossa liberdade, oras. Fazermos e sermos o que quisermos, desde que nossas atitudes não atentem contra nosso código de ética.
Não há nenhum sentido em dar palanque a opiniões retrógradas, vindas de homens ou mulheres. Elas não merecem ser repercutidas, pois ficaram no passado. Gritar e esbravejar contra elas reascender um debate que já foi definido há muito tempo. É valorizar ideias que não são adequadas aos novos tempos. É prejudicar nossas conquistas.
A luta pelos direitos das mulheres terminou. Hoje, somos todos iguais. Foi com espanto, portanto – e também com certa irritação -, que recebi a repercussão, na última semana, sobre uma reportagem que retratou a esposa do vice-presidente da República como uma mulher “bela, recatada e do lar”.
Não vou ficar perdendo tempo com análises sobre a reportagem, que achei boba e superficial, dessas sem importância, que a gente esquece segundos após ler. Lembro-me de ter pensado: “Essa garota tem chances concretas de ser, em breve, a primeira dama. Merecia um perfil mais bem elaborado.”
O que importa, mais que a reportagem, é a reação a ela. Houve um estardalhaço nas redes sociais. Uma gritaria por parte de mulheres – e homens – que se sentiram agredidas, diminuídas e vítimas, ao considerarem que as características “bela, recatada e do lar” foram colocadas como um padrão a ser seguido pelas mulheres.
Mas já não é fato que não temos de seguir padrão nenhum? Já não é consenso que aprendemos, com as lições das grandes mulheres do passado, a nos respeitar como aquilo que somos e que queremos ser, e não como o que esperam de nós?
A gritaria acabou criando um falso cenário, em que as mulheres são oprimidas por seus homens e não têm o direito de falar, de pensar, de agir. Isso não é verdade: não somos vítimas, não somos oprimidas. Não somos, muito menos, minoria. Não devemos nos comportar como tal. Fazendo isso, em vez de lutar pelo direito das mulheres, estamos dando combustível aos que são contra a consolidada conquista desses direitos.
O feminismo foi um movimento importante e devemos agradecer a ele por agora podemos ser tudo: do lar, do bar, da pista, da oficina mecânica, do escritório, da praia. Recatadas, debochadas, escancaradas, polêmicas.
Mas o radicalismo feminista não é mais necessário, e não ajuda em nada. Que tal, então, aproveitarmos nossa liberdade? Que nossas mães não tiveram. Nossas avós, muito menos. Que tal pararmos com o drama e, principalmente, com a paranoia? Há tanta coisa real com que se preocupar agora, nesse País…
Ah propósito, o jornalismo automobilístico tem cada vez mais mulheres, que gostam de carros e sabem dirigir muito bem. Que sabem avaliar um automóvel, até na pista. E que brilham em suas carreiras! Há oportunidade: basta querer e se dedicar.
E POR FALAR EM PARANOIA
Nem venham me dizer que o “Tchau querida” no cartaz dos deputados durante a votação do impeachment na Câmara foi uma manifestações de machismo – sim, li isso por aí. De todas as manifestações grotescas daquele espetáculo horripilante, essa foi uma das únicas que não teve nada demais.
Qualquer pessoa que está acompanhando o noticiário político – e não conheço quase ninguém que não esteja – sabe que o “Tchau querida” é uma ironia às conversas telefônicas entre Dilma e Lula interceptadas pela Polícia Federal. Dizer que é machismo já é paranoia demais, não é?
Newsletter Jornal do Carro - Estadão
Receba atualizações, reviews e notícias do diretamente no seu e-mail.