Era uma vez uma montadora de carros velhos. E, quando esses carros velhos começaram a ficar velhos demais, se transformaram em “gambiarras”. Assim era a Chevrolet Brasil da década passada.
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Dá para acreditar que, no período de uma década, a montadora se transformou em um verdadeiro fenômeno de vendas? Como a Chevrolet conseguiu isso?
Observadora ativa de todo esse período – sou jornalista automotiva desde 2003 -, acredito que sejam cinco os pilares do sucesso. Eles são investimento em conectividade para todos, foco nas vendas no varejo, melhoria do pós-venda, atuação forte em segmentos além dos de entrada e aposta no custo-benefício.
Para explicar esses pilares, primeiro preciso fazer um breve contexto histórico. Na primeira metade dos anos 2000, a Chevrolet só tinha carros velhos em sua linha. Carros que usavam versões aprimoradas de um “pré-histórico” motor, o do Monza.
Havia Astra, Zafira, Corsa. Todos já em novas gerações na Europa e parados no tempo aqui. Era a marca dos carros jurássicos.
Depois, começaram a surgir as “gambiarras”. Um Vectra que não era Vectra, por exemplo. O carro tinha base de Astra. Do velho Astra brasileiro, não do europeu. Depois, veio o Agile, um dos piores carros dos últimos tempos. Você pode ler mais sobre as gambiarras da Chevrolet aqui.
O Agile, porém, foi uma boa jogada à espera do Onix. E da nova geração do sedã Prisma. Aí, veio o pulo do gato da Chevrolet.
MULTIMÍDIA PARA TODOS
O Onix foi lançado em 2012. Um pouco depois, veio o novo Prisma. Com eles, chegou a central multimídia MyLink para carros de entrada.
É uma central barata, que usava muitos dispositivos do próprio celular nos primórdios. Uma central que não elevava demais os preços dos carros de entrada.
E é também uma central simples e fácil de usar. Com o sistema MyLink, a Chevrolet se antecipou à concorrência. Previu que, nos anos seguintes, a ecntral multimídia seria mandatória em todos os segmentos.
Quando o consumidor passou a fazer questão absoluta desse sistema, quais eram os carros de entrada que o tinham? Onix e Prisma. O resto teve de correr atrás. E levou tempo. A Chevrolet triunfou.
CUSTO-BENEFÍCIO
Os carros da Chevrolet podem até não ser os mais baratos. Mas são os que oferecem melhor custo-benefício. Ou, ao menos, a tradução do brasileiro sobre o conceito de custo-benefício: a relação preço-equipamentos.
Um exemplo simples é a comparação de Golf e Cruze Sport6. O Golf é mais barato, já que tem mais versões.
O Cruze Sport6 é simplificado no quesito versões. Só tem motor 1.4 turbo e câmbio automático. Seu preço inicial é bem maior que o do Golf. Porém, na versão equivalente em motorização, custa bem menos, e tem melhor custo-benefício.
A Chevrolet percebeu que o consumidor de hatches médios quer um carro rápido, automático e bem equipado. Investiu tudo nisso. Resultado: o Cruze é líder disparado. Veja aqui detalhes sobre a rivalidade entre Golf e Cruze.
Outro que chega com um custo-beneficio incrível é o Equinox. O novo SUV médio será assunto de um post individual em breve.
ATUAÇÃO EM VÁRIOS SEGMENTOS
Muitos dizem que a Chevrolet optou por ser hoje o que a Fiat era no passado. Não é verdade. A liderança da Chevrolet é muito mais consistente.
A Fiat, em sua década e meia de liderança, apostava tudo nos segmentos de entrada. A Chevrolet é líder em um contexto diferente do mercado, em que as categorias de entrada já não bastam. É preciso ir além.
Assim, a Chevrolet oferece o Onix Joy, de cara velha, mas mais barato. Como a Fiat fazia com o Palio Fire.
No entanto, não se descuida de outros segmentos. É líder, ou ao menos um grande destaque, em quase todos os que atua. Tem o primeiro lugar entre os sedãs compactos, os sedãs compactos premium e os hatches médios.
Além disso, a S10 está disputando com a Hilux o primeiro lugar entre as picapes médias. O Cruze vem se aproximando do Civic na briga pelo segundo lugar da categoria de sedãs médios.
A grande falha é na segunda maior categoria do Brasil, a de SUVs compactos. Disso, falaremos detalhadamente abaixo.
VENDAS NO VAREJO
Até a primeira metade da década passada, a Chevrolet apostava tudo nas vendas no atacado. Quando isso começou a mudar, a marca deu um grande passo na disputa pela liderança.
Isso porque as vendas no atacado, além de menos lucrativas, não são sustentáveis. Elas dependem de contratos, não do gosto do consumidor.
Pelo menos dois anos antes de obter a liderança de fato – o que ocorreu em 2016 -, a Chevrolet já era líder no varejo. Assim, já era a preferida do consumidor final.
Fazendo um paralelo com o pilar anterior, da pra dizer que hoje é a Fiat que se tornou o que a Chevrolet era no passado. A base das vendas da italiana é o atacado, algo que mostra uma tendência de abandono do consumidor final à marca.
PÓS-VENDA
Quando o assunto é pós-venda, as newcomers (montadoras instaladas no Brasil a partir do fim da década de 90) sempre foram a referência. Especialmente as japonesas. As quatro grandes, grupo que inclui a Chevrolet, nunca foram muito bem nesse parâmetro.
Pois bem: a Chevrolet também reverteu essa situação. Entre as quatro grandes (além dela, esse grupo inclui Fiat, Volkswagen e Ford), é a mais bem colocada no ranking de pós-venda da J.D. Power (veja abaixo).
Os carros da marca têm manutenção barata. Isso acaba de refletindo na queda do preço do seguro. Além disso, não são constantes as reclamações de leitores sobre os modelos da montadora, algo que fica claro no ranking de queixas da seção Defenda-se, do Jornal do Carro. A marca não aparece entre as dez com mais queixas.
NEM TUDO É ALEGRIA
Hoje, o Onix tem uma liderança mais sustentável do que a do todo-poderoso Gol. O emblemático Volkswagen, ao menos na década passada, sempre teve o Palio fungando em seu cangote.
Ninguém ameaça o Onix. Há três meses, ele bate recorde de vendas e obtém mais emplacamentos que a soma dos de segundo e terceiro colocados.
Apesar disso, e da boa atuação em outros segmentos, a marca precisa investir em três frentes para não ser ameaçada. A primeira é a de SUVs compactos.
O Tracker não deu certo. Mal aparece no “top 10” do segmento. O ex-presidente da GM, Jaime Ardila (cuja gestão é a grande responsável pelo êxito que a empresa está obtendo agora), já havia admitido isso. E contado que a marca trabalha em um novo SUV compacto, a ser feito no Brasil. Resta saber se, chegando depois, ele conseguirá um grande diferencial para encarar a forte concorrência.
A segunda frente é a de picapes que não são medias. A Montana não vende nada. Não é páreo para Saveiro e Strada. E há agora as intermediárias, que tem a Fiat Toro como referência.
As picapes intermediárias vão ganhar mais representantes nos próximos anos. Uma delas é da Chevrolet. Já na categoria de compactas, não há informação sobre sucessora da Montana.
Por fim, há a questão dos motores. O 1.4 turbo dos carros médios é uma referência, mas os dos segmentos de entrada são velhos. A maior parte das montadoras concorrentes já se atualizou. A Chevrolet, até agora, nada.
Há anos, existem rumores sobre o desenvolvimento de uma nova família de motores para os carros de entrada da Chevrolet. Ainda estamos aguardando. A conferir.
Para finalizar, a dois meses do fim do ano, a Chevrolet reina no ranking. Tem 319.341 emplacamentos acumulados, 33,1% a mais que a segunda colocada, a Fiat (que soma 239.913). Não pode mais ser alcançada.
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