Primeira Classe

Por que os preços dos carros não caem em tempo de crise

Se a marca vende menos, precisa aumentar a margem por produto comercializado. E isso não é de hoje: 'carro popular não dá lucro', costumava dizer um importante executivo

Rafaela Borges

07 de set, 2016 · 7 minutos de leitura.

Por que os preços dos carros não caem em tempo de crise
Crédito: Se a marca vende menos, precisa aumentar a margem por produto comercializado. E isso não é de hoje: 'carro popular não dá lucro', costumava dizer um importante executivo

Produção cai mês a mês para reduzir estoques e encontrar equilíbrio (Foto: Marcio Fernandes/Estadão)

Não é novidade que a crise econômica acertou em cheio a indústria automobilística. Que depois de anos de euforia, veio a queda nas vendas, inicialmente lenta, e vertiginosa nos últimos dois anos. Também não é segredo que os preços dos veículos, em vez de caírem – para atrair mais clientes -, estão aumentando. Por quê?

(No Instagram: @blogprimeiraclasse)

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Primeiro, vem o óbvio: a inflação está em alta, o dólar aumentou – impulsionando os preços tanto dos importados quanto da matéria-prima dos nacionais – e algumas reduções de imposto concedidas a curto prazo já deixaram de valer. Isso impulsionou as tabelas para o alto.

O problema, porém, é mais complexo. E aqui, é importante ressaltar: o principal objetivo de uma empresa não é vender, é lucrar. Reduzir os preços dos carros – ou ao menos não efetuar aumentos – faria, em uma situação de crise, os lucros voltarem ou subirem – ou geraria redução no prejuízo? A resposta: não.

O que é preciso fazer então? Adequar-se aos tempos de crise para voltar à lucratividade. E aumentar a margem de lucro por produto, uma vez que as vendas estão em baixa.


As montadoras perceberam rapidamente que, nos segmentos de entrada, não obteriam êxito na missão do lucro. Afinal, em 2015, quando a crise apertou, as únicas marcas que cresceram no Brasil foram as de luxo. Mais precisamente, aquelas que tinham carros de alto valor agregado entre R$ 100 mil e R$ 150 mil (Audi, BMW e Mercedes-Benz, principalmente).

Isso estava ocorrendo porque, primeiramente, a crise chega depois às classes mais altas. Além disso, o principal problema – e isso já vem ocorrendo desde 2014 – não é o preço, e sim a redução da oferta de crédito. As compras nos segmentos de entrada são baseadas em financiamentos. Sem parcelar, não dá.

E o que faz esse cliente quando não consegue financiar, seja por não obter crédito ou por encontrar apenas juros muito altos? Não compra.


Um dos principais executivos da indústria automobilística nos anos 90 e na década passada costumava dizer: “Carro popular não dá lucro”. Claro que há exagero na afirmação, mas é fato que, quanto maior o valor agregado, maior é o lucro da montadora. Isso não é de hoje; é de sempre.

Esse contexto fez com que as montadoras voltassem seus esforços para segmentos de maior valor agregado – leia-se de carros mais sofisticados e caros. Há, por exemplo, muitas opções de financiamento com “taxa zero” – alguns modelos mais baratos também têm essas condições, mas não com grande frequência.

“É uma maneira de dar ao cliente a opção de não ficar descapitalizado na compra do carro”, disse recentemente um executivo da Ford. Traduzindo: são pessoas que têm dinheiro para comprar, mas ganham a opção de parcelar sem juros, ou com juros muito baixos.


Outro fenômeno recorrente nesses tempos de crise é colocar mais itens de série nos carros, mesmo os de segmentos de veículos mais baratos. Resultado: se tem mais itens, tem preço mais alto – e também maior margem de lucro para as marcas.

Por que a Honda não lançaria um Civic cheio de equipamentos e com um motor moderno e eficiente por R$ 125 mil? A marca não quer vender cinco mil unidades por mês, mas sabe que há clientes para essa opção de topo. E há lucro.

Mais: uma marca vai em breve lançar no País a versão atualizada de um sedã. Por ora, não posso divulgar detalhes sobre esse carro, mas algo me chamou a atenção: a versão de entrada continua em linha, mas a estratégia é toda voltada às configurações que têm motor mais potente e moderno – e que trazem maior margem à montadora.


É uma tendência do mercado, e que deve perdurar por alguns anos. Ainda que o governo tome medidas para reduzir os efeitos da crise, as coisas na indústria automobilística não acontecem do dia para a noite.

Reflexos já estão sendo vistos no ranking de vendas desde o ano passado: Corolla, HR-V e Renegade, todos com preços iniciais acima de R$ 60 mil, estão entre os mais vendidos. Enquanto isso, os “populares” Gol e Uno vão perdendo espaço mês a mês.

Mas e os estoques? As montadoras estão, cada vez mais, reduzindo a produção de carros. Em breve, vão encontrar o equilíbrio entre produção e vendas – e o retorno à rica era dos lucros.


Enquanto isso, aumenta o desemprego. E o carro vai ficando novamente inacessível aos brasileiros. Reflexos cruéis de uma grave crise.

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Oficina Mobilidade

Testes de colisão validam a segurança de um carro; entenda como são feitos

Saiba quais são os critérios utilizados para considerar um automóvel totalmente seguro ou não

03 de mai, 2024 · 2 minutos de leitura.

Na hora de comprar um carro zero-quilômetro, muitos itens são levados em conta pelo consumidor: preço, complexidade de equipamentos, consumo, potência e conforto. Mas o ponto mais importante que deve ser considerado é a segurança. E só há uma maneira de verificar isso: os testes de colisão.

A principal organização que realiza esse tipo de avaliação com os automóveis vendidos na América Latina é a Latin NCAP, que executa batidas frontal, lateral e lateral em poste, assim como impactos traseiro e no pescoço dos ocupantes. Há também a preocupação com os pedestres e usuários vulneráveis às vias, ou seja, pedestres, motociclistas e ciclistas.

“Os testes de colisão são absolutamente relevantes, porque muitas vezes são a única forma de comprovar se o veículo tem alguma falha e se os sistemas de segurança instalados são efetivos para oferecer boa proteção”, afirma Alejandro Furas, secretário-geral da Latin NCAP.

As fabricantes também costumam fazer testes internos para homologar um carro, mas com métodos que divergem do que pensa a organização. Furas destaca as provas virtuais apresentadas por algumas marcas.

“Sabemos que as montadoras têm muita simulação digital, e isso é bom para desenvolver um carro, mas o teste de colisão não somente avalia o desenho do veículo, como também a produção. Muitas vezes o carro possui bom design e boa engenharia, mas no processo de produção ele passa por mudanças que não coincidem com o desenho original”, explica. 

Além das batidas, há os testes de dispositivos de segurança ativa: controle eletrônico de estabilidade, frenagem autônoma de emergência, limitador de velocidade, detecção de pontos cegos e assistência de faixas. 

O resultado final é avaliado pelos especialistas que realizaram os testes. A nota é dada em estrelas, que vão de zero a cinco. Recentemente, por exemplo, o Citroën C3 obteve nota zero, enquanto o Volkswagen T-Cross ficou com a classificação máxima de cinco estrelas.

O que o carro precisa ter para ser seguro?

Segundo a Latin NCAP, para receber cinco estrelas, o veículo deve ter cinto de segurança de três pontos e apoio de cabeça em todos os assentos e, no mínimo, dois airbags frontais, dois laterais ao corpo e dois laterais de cabeça e de proteção para o pedestre. 

“O carro também precisa ter controle eletrônico de estabilidade, ancoragens para cadeirinhas de crianças, limitador de velocidade, detecção de ponto cego e frenagem autônoma de emergência em todas as suas modalidades”, revela Furas.

Os testes na América Latina são feitos à custa da própria Latin NCAP. O dinheiro vem principalmente da Fundação Towards Zero Foundation, da Fundação FIA, da Global NCAP e da Filantropias Bloomberg. Segundo o secretário-geral da entidade, em algumas ocasiões as montadoras cedem o veículo para testes e se encarregam das despesas. Nesses casos, o critério utilizado é o mesmo.

“Na Europa as fabricantes cedem os carros sempre que lançam um veículo”, diz Furas. “Não existe nenhuma lei que as obrigue a isso, mas é como um compromisso, um entendimento do mercado. Gostaríamos de ter esse nível aqui na América Latina, mas infelizmente isso ainda não ocorre.”