A evolução dos preços dos carros novos está assustando os brasileiros. Sobretudo os valores dos super lançamentos. É uma questão matemática: um SUV compacto que custava na faixa de R$ 70 mil em 2020, agora tem tabela a partir de R$ 100 mil. Isso para falar de modelos com versões mais básicas e motores aspirados. Com turbo e equipamentos modernos, os valores já chegam a patamares impensáveis no início da pandemia.
Neste mês, o Jornal do Carro trouxe um levantamento feito pela a KBB (Kelley Blue Book Brasil), consultoria especializada em precificação de veículos. O estudo apontou que, em média, os reajustes feitos pelas montadoras foram de 25,4% até um pico de 35%. Neste estudo, o modelo que mais subiu de preço foi o Hyundai Creta, sobretudo porque o SUV feito em Piracicaba (SP) ganhou nova geração, ficando mais sofisticado.
Dos últimos lançamentos de maior relevância, todos encareceram rapidamente logo após chegarem às lojas. O Fiat Pulse, por exemplo, estreou em outubro de 2021 a partir de R$ 79.990. Atualmente, o SUV da marca italiana parte de R$ 87.990 – ou seja, está R$ 8.000 mais caro. Já a versão de topo de linha Impetus 1.0 turbo tinha tabela de R$ 115.990 e agora já alcança R$ 123.490 – isso em menos de seis meses.
Para ilustrar essa conta, o Jornal do Carro traz abaixo uma tabela que mostra a evolução dos preços. A maioria da lista estreou em 2021, mas há outros modelos anteriores com boa saída, caso da líder de vendas Fiat Strada e do Chevrolet Tracker, que trocaram de geração em 2020. E do Volkswagen T-Cross, que estreou em 2019 e foi líder dos SUVs no ano seguinte. Os valores são de entrada, o famoso “a partir de”. Veja:
Evolução dos preços dos carros novos
Demanda maior que a oferta?
Segundo o economista e coordenador dos cursos automotivos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Antônio Jorge Martins, a partir de 2021 as montadoras estão sendo direcionadas a dar lucro e caixa. E a falta de semicondutores fez com que as marcas começassem a priorizar seus carros mais tecnológicos. “Por isso não teremos mais os populares”, diz.
“Agora é necessário gerar resultados. Daí essa estratégia de semicondutores nos carros premium, com maior conteúdo tecnológico. Outro ponto é que a pandemia gerou aumentos de custo com containers, bem como com logística. Além disso, teve o aumento de dólar dos Estados Unidos, que subiu de um patamar de R$ 4,00 para R$ 5,60”, resume Martins.
Ou seja, além dos custos maiores com componentes importados, há uma nova estratégia de vender carros mais tecnológicos. E os SUVs compactos, que já respondem por metade das vendas de carros novos no País, estão puxando a fila, com recursos semiautônomos, como frenagem automática de emergência e faróis adaptativos, e conectados à internet.
Carros usados na crista da onda
Para o professor da FGV, o mercado só vai se readequar quando a oferta de carros novos se normalizar. Neste início de ano, a falta de chips e outros componentes continua a atrapalhar várias fábricas no País, que não conseguem entregar alguns veículos. É o caso do Jeep Commander. Os pedidos foram suspensos após a fila de espera chegar a 180 dias.
Com os estoques de carros novos limitados e os longos prazos de entrega, o mercado de usados deve continuar aquecido em 2022. É o que acredita Thiago Vasconcelos, diretor de negócios da Fandi, fintech que fornece software de gestão de vendas para mais de 1,5 mil concessionárias no País. Ele chama a atenção para o novo mercado de startups “C2C”.
Essas novas empresas, como Instacarro, Kavak e Carupi, estão “expondo um movimento que acontecia, mas que não era muito acompanhado”. Por isso, “está gerando uma energia diferente”. “Independente das fábricas atenderem a demanda por carros novos, o mercado de usados será muito próximo ou maior do que foi em 2021”, acredita Vasconcelos.
Financiamento como assinatura
Com os preços dos carros novos lá no alto, e o crédito mais restrito, surgem, então, novos modelos de negócio. Um deles é o chamado “financiamento balão”, mas com a “recompra garantida”. “Os bancos começaram a transformar o CDC numa ferramenta de assinatura de veículos”, aponta Thiago Vasconcelos, da Fandi.
A conta fica assim: entrada de 20%, parcelamento de 40% em 24 vezes, por exemplo, e parcela final com os 40% restantes. “Na última, que é mais pesada, os bancos sugerem a recompra, e o valor pago fica como entrada para o novo contrato. Então, a percepção de quem está dentro é ‘vou pagar menos para ter um carro novo a cada dois anos'”, explica Vasconcelos.
Nesse formato, tecnicamente é um financiamento, mas o cliente compra como locação. Ou seja, é usuário do veículo e não o proprietário. Para o professor da FGV, Antônio Jorge Martins, a assinatura de carro veio também como “uma forma de minimizar o poder de barganha das locadoras”, que, em 2021, responderam por 45% do total de carros novos.
Martins lembra que a sociedade brasileira “perdeu capacidade de consumo”. “Está difícil, praticamente todo mundo perdeu, a média da população perdeu. Não houve elevação dos salários. Mas não vejo um movimento nas montadoras, da forma como estão, de reduzirem os preços. Por isso, vão surgir novas formas de negócio que aumentem o prazo e facilitem o acesso ao crédito”, pondera o economista.